Uma Vida de Circo XXI

A VIUVEZ

Depois da morte do fazendeiro, as coisas para mim ficaram mais pesadas. Vieram os júris, o inventário. Tinha herdado muitas terras, mas não sabia o que fazer com elas. Estava sozinha com seis crianças para acabar de criar. Não tinha a quem pedir ajuda e orientação. Não tinha um ombro amigo para me apoiar. Não entendia nada de fazenda. O gado foi sumindo misteriosamente, as criações também. As colheitas desapareciam. As cercas de arame eram cortadas. Virou um caos!

Senti-me perdida, sem saber o que fazer.

Vendi, então, quase todas as terras e comprei casas para alugar. Tirava assim o dinheiro para nossa sobrevivência.

Vieram os colégios, as formaturas, os casamentos...

Éramos uma família feliz. Os filhos sempre foram para mim a maior riqueza.

Devagarinho foram saindo, um por um, procurando seus destinos, indo para cidades longínquas. Éramos sete à mesa, depois ficaram seis, cinco, quatro, três, dois, até restar um. O embrulho de pão que comprava todos os dias foi ficando menor, menor, menor...

Eu me sentia perdida dentro daquela grande casa, sem ter com quem conversar. Preocupada em criar meus filhos e educá-los, tinha esquecido de pensar em mim, fazer amigos e freqüentar a sociedade.

A vida se resumia em cuidar dos filhos e cuidar da casa que era barulhenta e ficou silenciosa. Era como se eu tivesse chegado ao fim da estrada.

Sentia-me como uma guerreira que tinha ganho todas as batalhas e perdido a guerra. Já não tinha por quem lutar, para que lutar e por que lutar.

Aí eu comecei a escrever um diário. Era meu amigo calado. Os filhos vinham me visitar uma vez ou outra e me encontravam sempre sorrindo. Eu fingia que estava tudo bem. Não queria dar a eles o mínimo de preocupação.

A solidão veio chegando e com ela a descrença, o desânimo, até que adoeci gravemente. Foram meses de cama. Os médicos não me curavam, por não existe remédio para solidão, depressão e tristeza.

(Do livro “Retalhos de Uma Vida” - de Aparecida Nogueira)

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 24/12/2007
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