MINHAS COPAS DO MUNDO
Tenho imprecisas lembranças da Copa de 1954, mas recordo que torci para a Hungria de Puskas contra a Alemanha, no jogo decisivo, vencido pelos implacáveis germânicos. Morava em Encantado. Os "coxas brancas" europeus voltavam ao controle do reino da bola. Em 1958, pelo rádio a válvulas General Electric, made in USA, ouvi a vitória grandiosa, inédita, do Brasil contra a Suécia, na companhia de meu pai, na cidade de Encantado. Mas, o jogo contra a União Soviética, eu ouvi através dos alto-falantes instalados na Praça da Alfândega, em Porto Alegre, o povo ligadíssimo e vibrante: " A Taça do Mundo é nossa, com o brasileiro, não há quem possa. E...eta esquadrão de ouro, é bom em tudo, é bom no couro...". A França, diga-se, contava também com uma grande seleção, com Raymond Kopa e Just Fontaine e praticamente não havia negros no time. Aliás, foi com o aumento do número de negros e de imigrantes das antigas colônias, que atingiu o auge no futebol. Não vamos esquecer jamais de craques como Zinedine Zidane e Henrry Thiery. Também por rádio, radinho a pilha, acompanhei a jornada de 1962, sozinho, na casa dos avós, que não se empolgaram com o evento, não curtiam futebol. É emoção diferente, mas não é verdade que, no estádio, a vibração seja maior. Em 1966, já morando com meus pais, no Edifício Jaguaribe, ali na Avenida Salgado Filho, em Porto Alegre, o acompanhamento foi rápido e sem graça, pois a derrocada brasileira ocorreu logo na primeira fase. Em 70, dava um tempo no trabalho e ia assistir às partidas do Brasil, pela tevê, também na casa de meus pais, que era perto. O grande jogo foi Brasil e Inglaterra, campeã de 1966. O meu gol inesquecível foi justamente nesse jogão de bola, feito pelo Jairzinho, Brasil 1 x 0 Inglaterra. O povo foi às ruas após a partida, já no início da noite, chuva de papel picado dos edifícios, festa total, Ruas da Praia, Andrade Neves e Salgado Filho apinhadas, uma loucura. Na final contra a Itália, rolou um prato esperto de camarão na casa dos futuros sogros, na Vila Assunção, alguns amigos convidados, pois acreditávamos piamente na vitória. Em 74, 78, 82, 86 e 90, tudo se passava em minha própria residência, também na Vila Assunção, pela tevê, assim como as partidas da conquista de 94, cuja final reuniu imenso grupo de amigos de meus filhos num churrasco caseiro, com muita cerveja, tensão, gritos e lágrimas, até o último dos pênaltis eletrizantes. Excepcional desforra para a geração de meus filhos, que não conhecia o prazer de um campeonato mundial. Cabe dizer que, em 78, na Argentina, o técnico Coutinho declarou que fomos "campeões morais", com um terceiro lugar invicto e só não fomos ao título pelo presumível arranjo do jogo Argentina 6 X 0 Peru, que a classificou. Em 82, talvez nossa melhor seleção de futebol, caímos para um Paolo Rossi inspiradíssimo, da Itália, e o campeonato mundial esvaiu-se nas lágrimas de meu filho pequeno. Coisas do futebol. Só voltamos a vibrar em 2002: a refrega final, contra a temível Alemanha, assisti com minha filha, em meu apartamento da Fernando Machado, no raiar do dia. As outras Copas nem merecem comentários. Em 2014, viramos sede de mundial tal como em 1950, mas é melhor ignorar o acontecimento. No penta de 2002, meu velho pai, um apaixonado nestas competições mundiais, explique-se, havia falecido há um ano. O extraordinário foi que, após o primeiro gol do Brasil, sem mais nem menos, o porta-retrato com a foto do velho, que repousava na prateleira do armário de parede, atirou-se ao chão da sala, num típico lance de pura euforia. Recolhi-o e ajeitei-o à feição para acompanhar comodamente o restante do jogo. Grande partida, vitória espetacular da seleção e todos nós, ali, eu, Paula e a foto dos pais, festejando muito. Nunca mais se repetiu o fenômeno, por mais forte que fosse o vento, por mais que eu pulasse como teste ou desafio, mas o Brasil também não foi mais campeão do mundo.