Uma Vida de Circo XVI
PRISÃO SEM GRADES
Com o passar dos tempos, a vida foi se tornando insuportável naquela roça. O fazendeiro pouco parava em casa. Estava sempre em comitiva, levando ou trazendo gado. Ficava semanas viajando. Para mim, era como se estivesse numa prisão fazenda. As noites eram longas e silenciosas. Ninguém para conversar. Não tinha vizinho perto, nem rádio, nada! Só silêncio, quebrado, de vez em quando, pelo mugido do gado e coaxar dos sapos.
Quando escurecia, eu ficava sentada na escada da porta da sala, ouvindo o cri-cri dos grilos e pensava:
- Isto é que ser fazendeiro! Isto é ser rico! Que saudade do Circo, dos personagens, do trapézio, da minha gente, de tudo!
E assim se passaram dias, semanas, meses e anos!
Nenhuma diversão, nem passeio, nada!
Para o fazendeiro é como se tivesse comprado uma boneca para enfeitar a casa, sem vontade própria. Ele continuava a chegar de suas andanças, altas horas da noite.
Eu ia definhando de tanta contrariedade, chegando a emagrecer vinte quilos, apesar de tanta fartura em casa.
Eu não tinha a quem reclamar. Minha mãe estava viajando com o circo pelo Brasil afora. Mas chorar pra quê? A escolha foi minha, peguei o bastão e vou leva-lo até o fim. Fugir não seria a solução, pois o fazendeiro era poderoso e me acharia onde eu estivesse.
Eu era feliz sem a riqueza,
E como estava enganada.
Me deram tudo,
Eu não tinha nada...
***
Mas tudo nesta vida tem suas compensações.
(Do livro “Retalhos de Uma Vida” - de Aparecida Nogueira)