Paranormalidade (um romanci faltando “e”)
Desde o começo da semana sem pão, sem manteiga, ilhado aqui na chácara, sem coragem de encarar a tempestade lá fora e com o Movimento Oulipo, com George Perec na cabeça. Intrigado, me perguntando como é possível escrever um romance, um romance com mais de duzentas páginas, sem usar a letra “E”.
Sujeitinho exibido esse tal desse Perec. Eu aqui em paz (mesmo com os roncos da barriga), mais uma vez esperando pacientemente a chuva passar para ir ao mercado, vez ou outra lutando para rabiscar uma cronicazinha, diga-se de passagem, tendo todas as letras do alfabeto a disposição, e ele me vem com um soco desses na minha cara, uma novela inteira sem se valer da tal vogal!
Paranormalidade, mediunidade, escrita automática guiada por espíritos do Além? Richard Wiseman conseguiria explicar cientificamente os supostos poderes sobre-humano desse homem que não precisava da letra E para escrever? Não sei. Só sei que já tentei de tudo para rabiscar alguma coisa de valor nessa semana de diluvio e fome, até cacho de banana da bananeira do vizinho peguei (na esperança que me trouxesse alguma sustança e com isso escreveria), fazendo com que os macaquinhos Sagui ficassem putos comigo — mas nada aconteceu, nem uma única frase que preste saiu.
De qualquer maneira, hoje é quarta. A previsão é de que na sexta a chuva se vá. Sexta então, se tudo der certo, vou na cidade. Compro comida e aproveito para retirar as encomendas que chegaram. Gordão Radiadores e Autopeças, é o nome do local da retirada. Enquanto isso, vou sobrevivendo com essas bananinhas aqui. Escrevendo. Lapidando essa crônica, a qual usei quase duzentas vezes a letra E.
E pau no cú do George Perec. Passar bem.