Você tem fome de quê, você tem sede de quê
Ele chegou mais pra lá do que pra cá na sessão eleitoral. Um dos mesários, aparentemente bolsonarista, mesmo proibido de manifestar sua opinião, não conseguiu se conter e exclamou: “esse aí é eleitor do Nove Dedos, com certeza!”.
Claro que, numa eleição tão polarizada, a provocação não passaria desapercebida, um outro mesário, como se ficou sabendo, lulista daqueles de ir a reuniões do partido e tudo mais, retrucou: “no tempo que esse que você chama de bêbado governava, o povo comia picanha, hoje, com esse governo, as pessoas estão roendo osso para não morrer de fome”.
“Fome? Que fome? Não existe fome pra valer no Brasil, isso é conversa mole”, replicou o mesário número um, reproduzindo fala do seu candidato em entrevista.
Enquanto isso, na fila, esperando sua vez de votar, o povo, bestializado, se perguntava: “Picanha? que picanha? Quando foi isso? Nunca vi, nem comi, só ouço falar!”.
O bêbado, talvez o único sóbrio ali, até então calado, ergueu a voz entaramelada das cachaças que havia tomado e esbravejou: “vão pro inferno todos vocês e seus malditos políticos!”, e seguiu trôpego a caminho da saída, desistindo de votar.
Ouviram do Ipiranga, às margens plácidas
De um povo heroico, o brado retumbante
E o Sol da liberdade, em raios fúlgidos
Brilhou no céu da pátria nesse instante!