TUBARÕES DO ASFALTO

Empresários de transportes coletivos partem do seguinte princípio: Quem viaja de ônibus não tem carro; quem não tem carro é de classe econômica desfavorecida. Logo, não tem cultura, discernimento, conhecimento de leis fundamentais para o exercício da cidadania.

Pensando assim, esses empresários atuam com total desrespeito aos passageiros e não capacitam nem orientam seus motoristas, cobradores e despachantes para lidar com o público dentro dos princípios de ética, boa educação, gentileza e cumprimento de leis. Daí vem o tropeço de vez em quando, pois entre o grande número de passageiros passivos, leigos ou tolerantes existem os exigentes, arrojados, conhecedores e cobradores de seus direitos, desde os mais rudimentares.

Também viajam de ônibus aqueles que recorrem à justiça quando levam um tombo, se o motorista não para totalmente o veículo para embarque ou desembarque, apesar do apelo e da obrigação; aqueles que vão a juizo por constrangimento no interior do coletivo; os que entram na justiça pelo atraso, o descumprimento de horário, quando isso lhes causa danos. Fora desse grupo socialmente correto há ainda os passageiros agressivos, descontrolados, que podem causar sérios prejuízos às empresas, externando sua revolta por meio de quebra-quebra. Pessoas até sérias e trabalhadoras, mas que perdem a paciência com o descaso, o desrespeito, a falta de compromisso e consideração.

É perigoso para qualquer empresário não saber que há muita gente pobre esclarecida; que nos ônibus, trens e lotadas viajam pessoas com apurado senso de cidadania e conhecimento dos direitos humanos, do código penal e da constituição. As universidades estão abarrotadas de gente humilde, mal vestida e de sotaques caipiras que são capazes de fechar empresas. Nas periferias e "cafundós" medram cidadãos com caras de bobos altamente influentes, poderosos e com domínio de leis, mesmo sendo passageiros de coletivos.

Entre as pessoas esclarecidas e exigentes que sabem que podem, quando, como e por que podem processar uma empresa de ônibus, estão alguns idosos, portadores de deficiências e estudantes. Esse grupo é o mais maltratado, "sacaneado" e preterido pelos motoristas e cobradores, quase sempre por ordem de seus patrões.

Ainda são poucos os processos movidos contra empresários desse ramo, o que os leva a continuar apostando na impunidade. Mas a cada dia os passageiros ficam mais informados, inconformados e exigentes, aumentando as surpresas dos tubarões do asfalto.

Seja como for, esclarecido ou leigo, analfabeto ou letrado, pobre ou rico, pagante ou não, todo passageiro é um cidadão digno de respeito. Deve ser esse o conceito empresarial repassado aos funcionários que atuam pelo bom (às vezes mau) nome das empresas, na lida direta com o público.

Quanto ao mais, tudo é passageiro. A vida é passageira. Pode ser muito curto, além de passageiro, o sucesso de um empresário que não respeita sua clientela. Neste caso específico, o passageiro.

Demétrio Sena
Enviado por Demétrio Sena em 02/12/2007
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