A Criança, a Angústia e o Canto dos Pássaros

Acordava e não ouvia nada, como num deserto; instantes depois chegava a visita indesejada.

Todos os dias bem cedinho a angústia me visita; ela sempre vem mergulhada no silêncio da manhã, invariavelmente acompanhada por um cachorrinho vira-lata. No princípio brigava com ela e pedia para que se retirasse, não gostava nem um pouco da sua presença, mas agora não brigo mais, pois agora finalmente compreendo a sua dor.

Quando olho para os olhos dela vejo a cena, como num filme, e sinto sua profunda tristeza quando a carreta vermelha desaparece na curva no final da rua, deixando em seu coração apenas um rastro de profunda saudade; é neste momento que ela com os olhos cheios de lágrimas — minha angústia chora — mais afaga o seu cachorrinho, transformando-se simplesmente numa criança que eu carinhosamente acolho, pegando em suas mãos e indo com ela em direção aos fundos da casa.

"Venha comigo criança, venha comigo... você chega sempre muito silenciosamente pelas manhãs, vamos mudar isto, quero que sua chegada seja sempre anunciada por uma maravilhosa orquestra tocando músicas muito bonitas", digo para ela que então me acompanha com o seu inseparável cachorrinho.

Então, dia após dia, semana após semana, mês após mês, ano após ano, depois de sua chegada na silenciosa manhã vamos para o quintal, onde plantamos conjuntamente um montão de árvores de todas as espécies que cabem no infinito espaço de nossos corações; o tempo passa, a visita matinal e o processo vão repetindo-se assim como se repete diariamente o maravilhoso giro da terra em torno do sol, até que um dia, na chegada da aurora ouço uma sinfonia de passarinhos cantando alegremente nos fundos do quintal, todos eles voando e pousando alegremente na infinidade dos galhos das árvores ali presentes.

Neste momento eu sei que a angústia, ou melhor, que a radiante criança que habita em mim está chegando, convidando-me mais uma vez para acenarmos conjuntamente para a carreta que desaparecerá inevitavelmente na curva da rua, para logo em seguida caminharmos juntos para o morro no lado leste da casa, onde nasce o sol e a esperança. a fim de plantarmos mais cantos de pássaros através das maravilhosas árvores que brotarão do chão.

Desperto finalmente e ouço o canto dos pássaros, como numa floresta tropical; daqui a pouco chega a criança amada.

Agricultor Urbano
Enviado por Agricultor Urbano em 30/09/2022
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