O reflexo do sol entrando pela janela
Mais um domingo de manhã. Tenho gostado deles nos últimos anos. Acordo, coloco um álbum qualquer pra tocar, jazz, Ryo Fukui, e fico deitando na cama, olhar fixo na tela do notebook, pensando o que escrever. É bom. Aliás, para mim, não existe nada melhor do que escrever em dias assim – o reflexo do sol entrando pela janela , o barulho das pessoas conversando do lado de fora, os latidos dos cachorros na vizinhança, as ideias trocadas e pensadas ao longo da semana ainda ressoando na mente...
Mas, apesar disso tudo, ultimamente as palavras não estão vindo. Até me foram sugeridos alguns assuntos, como aquele sobre coincidências, ou iniciei crônicas, como aquela sobre a estadia da Adenize aqui em casa:
“A Adenize chegou aqui na sexta. Ela trouxe mala com roupas, pente, escova de dente, cremes, notebook... e mais uma porção de coisas que nem chegou a usar. Passamos pouco mais de uma semana juntos: comemos, transamos, passeamos...”.
Contudo, parei por aí. Nada mais aconteceu, travei, as palavras se negaram a sair dos meus dedos. Não sei se acontece com todos que rabiscam seus pensamentos, mas comigo, para escrever, é preciso certo ritual, uma certa rotina, a mente vazia, ou quase vazia, sem muitas obrigações, preocupações, para somente assim a coisa toda descer – e a escola tem me atrapalhado.
Na escola tem os Rafinhas, os Enzos e os Kauãs, o horário a cumprir, as leituras preparatórias para aulas que eu não consigo dar (os Rafinhas, os Enzos e os Kauãs não deixam), a rede operacional, conhecida também como, “O Sistema”, e mais todas as frustrações, decepções e neuroses inerentes a prestigiada profissão: professor de ensino fundamental em escola pública do Estado de São Paulo.
Os DJs e os MCs venceram. Não existe muito o que fazer, não tem como competir com esses caras. Pouco importa o que foi ou deixou de ser o Renascimento Cultural na Itália do século XIV, quando temos um Dj Arana cantando por aí, “Então vem, aquece a buceta na minha pica, meu bem”. Ou você conhece algo mais poderoso do que o apelo sexual?
Mais um domingo de manhã: quem sabe dessa vez eu até consiga escrever, mesmo com eles dentro da minha cabeça, socando minha mente como pingueira em pia de inox no silêncio de uma madrugada...