A crônica é uma conversa silenciosa

O primeiro título que me ocorreu para este livro de crônicas foi o título da primeira: “A árvore da infância”. A minha justificativa é a mesma do português de Manuel Bandeira, que assim explicava a origem do nome de sua pensão “Península Fernandes”: “Fernandes porque é o meu nome, Península porque eu achei bonito.” Conclui Bandeira que essa é toda explicação para a poesia.

Eu achei bonito esse título, mas não servia para todo o meu livro. Então me lembrei da última parte: “Crônica de uma morte anunciada”. Era perfeito, cabia bem para toda a coletânea de minhas crônicas. Era uma crônica com todas as características de uma crônica. Além disso, chamaria a atenção dos leitores com a lembrança de Gabriel García Márquez.

Folheando as outras crônicas, reli “O afinador de pianos” e descobri o título que queria: “O afinador de silêncios”. Falei: “É a minha cara.” Sou conhecido por meu silêncio. Já pensaram que sou pouco inteligente, ou não sei como me expressar. Também dizem que não falo porque sou escritor, estou ouvindo, guardando informações para depois escrever. Isso pode ter certa verdade, mas a maioria dos escritores são bem falantes. Eu concluo que simplesmente tenho essa habilidade de ficar em silêncio.

Meses depois, já vencedor do concurso Uirapuru, com esse título, comecei a ler um romance de Mia Couto e vi que o primeiro capítulo da primeira parte chamava-se justamente: “Eu, Mwanito, o afinador de silêncios”. Eu já tinha para mim que era um título excelente, se soubesse que Mia Couto já o utilizara, teria prazer em tomar emprestado dele. Era um grande achado.

Mwanito era o filho preferido do pai, que voltava cansado de um dia de trabalho e o chamava para ficar em silêncio com ele. É uma arte ficar em silêncio. Mwanito tinha esse dom especial: ficar em silêncio. Era um afinador de silêncios, assim no plural, explica, porque não existe apenas um silêncio. Há silêncios para todas as ocasiões. “E todo silêncio é música”, completa Mwanito.

É como se Mia Couto estivesse me descrevendo: "Quando me viam, parado e recatado, no meu invisível recanto, eu não estava pasmado. Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude. Eu era um afinador de silêncios."

A verdadeira amizade é aquela que não precisa de palavras. Basta ao amigo ficar junto do outro amigo. A crônica é uma conversa de amigos, do autor com o leitor. Quanto mais silenciosa for a conversa, mais haverá a cumplicidade da verdadeira amizade entre eles.

Estas crônicas de “O afinador de silêncios” são uma comprovação desses meus silêncios. Algumas são muito curtas, porque o silêncio falava mais alto. Há crônicas de várias modulações – porque o silêncio tem várias modulações. Afine os ouvidos e ouça comigo.

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