ELA SE FOI

... sentiu, na noite coalhada de estrelas perfumadas, algo mais dorido que aquele meu triste gemido?

Tudo repousa em quietude misteriosa no prateado fulgor que emana da lua.

Tudo repousa no aroma que se inspira no ar, no frescor d'água que refresca a fronte febril.

Água, guardiã da cidade, que vigia seu repouso e lhe sussurra ao ouvido pequenos silêncios e os grandes ruídos das lendas que sobrevivem apesar do esquecimento.

... sob as estrelas, nesta noite tranquila, sinto palpitar meu ferido coração ...

... sussurro das águas ...

Quem poderá, um dia, compreender seu sotaque divino ...

Água que murmulha os mistérios que Deus canta!

... sentiu, na noite coalhada de estrelas perfumadas, algo mais dorido que aquele meu triste gemido?

Uma abelhinha zumbe entre as flores do campo, esperando a mão que abra a branca lua seus claros fulgores ... para dar à noite sonho e diamante.

... enquanto isso, ela em seu palácio de mármore, desfolha, uma a uma, as perolas de seus ricos colares.

Algumas desprendem-se com ecos de torrente entre seus dedos e descem ruidosas arrastando sobre o piso um fulgor de sua corrente em tom pastel.

Algumas perolas vão saltitando e chocam-se contra a parede ...

... sinto lacrimejar ... pouco a pouco, minha ferida, vai vertendo sangue, até ficar sem vida ...

Meus olhos estão cegos ... choro, imóvel ... o prateado das estrelas inundam ... no ar humidade e frio ... Na noite um frescor aquático...

A água chora, geme, suspira, canta e ri ... eterno murmúrio ... ao longe o ronco da serenata do rio ...

Meu sangue corre ... profundo silêncio das noites misteriosas ... escuto músicas sobre as velhas pontes ... sentimento também corre por minhas veias.

Adormece meu espírito ... sua partida ... meu desencanto ...música...

sorvo o desencanto em minha respiração ... penetra em minha carne, em lentas filtrações, sua fuga ... sua ausência ... sua partida ...

...então foge de meus olhos num furtivo pranto,

as águas, as águas...

Sentiu, na noite coalhada de estrelas perfumadas, algo mais dorido que aquele meu triste gemido?!

Pedro Troche Gonzalez

Pedro Antonio Troche Gonzalez
Enviado por Pedro Antonio Troche Gonzalez em 26/04/2022
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