AS MÁSCARAS
Conta uma história que em uma terra muito distante, todas as pessoas desse lugar usavam máscaras. Eram máscaras que cobriam todo o rosto. Não saíam de suas casas sem colocá-las cuidadosamente. E nisso eram já especialistas.
Era já um ritual!
Era já uma necessidade!
Eram máscaras bonitas, elegantes, finas e de bom material, bom acabamento. Protegiam todo o rosto.
Eram máscaras diversas: brancas, verdes, amarelas, coloridas, com ou sem enfeite, com ou sem detalhes, mas todas, sem exceção, causavam sempre uma boa impressão. E protegiam todo o rosto.
E assim, todos demonstravam, através de suas máscaras, felicidade e educação, tolerância e mansidão.
E assim, os rostos de cera eram sempre de civilidade, de cordialidade, de consideração.
Rostos bonitos, rostos alegres, rostos fraternos e muita comemoração!
Ninguém, de verdade, assumia nenhum ato ruim, um gesto nefasto, uma palavra cruel, um pecado, um erro que fosse. Nada, absolutamente nada!
Máscaras de candura e contemplação!
Quando algo de errado acontecia, ninguém era culpado! Ninguém assumia nada! Todos os rostos eram os mesmos: honra e compaixão! Como se santos fossem todos! Como se nada houvesse de errado! Nada! Absolutamente nada!
No entanto, com o passar do tempo, algumas pessoas, por descuido, pela pressa, por questionamento ou por outro motivo qualquer, deixaram com que suas máscaras tão preciosas caíssem e se quebrassem. Foi um horror! Um espetáculo monumental! Houve histeria e gritaria! Acusações e estupefações! Todos os erros e culpas foram simplesmente jogados para os infelizes que perderam suas máscaras…
Estas pessoas foram expulsas da cidade. E ficaram terrivelmente tristes por um longo momento. Choraram, reclamaram, culparam e se culparam, mas depois, com o pródigo avanço dos ponteiros, passaram a perceber de verdade o rosto uns dos outros, o sorriso uns dos outros e começaram a rir. E riram de seus próprios rostos… Viram que eram imperfeitos e que possuíam cicatrizes… Puderam ver as coisas de um modo diferente.
E mais que isso, homens e mulheres passaram a ver a si mesmos de forma diferente, verdadeira.
Sabedores da verdade e sabedores da realidade, perceberam ainda mais a injustiça que praticaram e a injustiça que sofreram. Decidiram, então, retornar à cidade. E retornaram!
E quando chegaram, nova confusão se fez.
E algo estranho, estranho mesmo, aconteceu…
Os que usavam máscaras não queriam mais a presença daqueles que não a usavam. E gritavam ferozmente. E agitavam os braços e apontavam, mais uma vez, os dedos.
Os que não usavam máscara apontavam a verdade! Os que usavam máscara não queriam ouvir o que quer que fosse…
E era uma cena patética: gente arrotando ignorância, mas máscaras indicando gentileza. Gente sendo violenta, mas máscaras sinalizando paz. Gente se aproveitando e agindo com desonestidade, mas máscaras mostrando a mais perfeita honestidade.
Até que, de repente, como algo inacreditável que sempre acontece em histórias inacreditáveis, ocorreu o fato: as máscaras, como que por mágica, partiram-se por si só… e rostos e mais rostos apareceram e todos, sem exceção, se entreolharam com grande perplexidade…
E o tempo que demorou essa perplexidade foi longo, muito longo…
Dizem que, após esse evento, as pessoas aprenderam que deveriam ser elas mesmas, que deveriam expor seus sentimentos e que ideias de guerra, intolerância, ganância e desonestidade deveriam ser banidas, extirpadas, esquecidas…
Contei essa história a um professor de perplexiologia.
Ele, abanando a cabeça, respondeu:
– Uma grande pena que, com a polarização e a pandemia, essa história tenha acontecido aqui ao contrário, as faces que se revelaram após a quebra das máscaras mostraram um mundo perversamente cinzento e pessoas incrivelmente más…