Palavra Solta - a menina do beco

Palavra Solta - a menina do beco

*Rangel Alves da Costa

Sempre ouvia que tivesse muito cuidado com aquele beco. Era muito estreito, era muito escuro, era perigoso demais. E também sempre ouvia que seus pais somente moravam ali por não ter outro lugar pra servir como moradia. A menina morava ali, naquele beco. Ao saírem, seus pais pediam por tudo que ela não abrisse a porta nem a janela, que não atendesse se alguém chegasse batendo, e que nem pensasse em sair sozinha por aquele perigoso labirinto. Mas a menina, pela idade ou por curiosidade, aos poucos foi desobedecendo. Abria janela, abria a porta, metia a cabeça do lado de fora e ficava olhando se algo estranho acontecia. Mas certa feita olhou para um dos cantos do beco e imaginou estar vendo olhos mirando em sua direção. Noutra feita, percebeu que mãos acenavam chamando. Depois achava, porém, que era só imaginação sua. E de repente passou a avistar mais olhos, mais mãos acenando, e também vozes chamando seu nome. Tinha apenas treze anos. Aqueles olhos, aquelas mãos e aquelas vozes, no passo seguinte já estavam lhe oferecendo drogas. E aos poucos ela foi aceitando. Não durou muito e passou a ser abusada sexualmente. E ela foi deixando. Os pais chegavam da luta e não encontravam mais ela em casa. Quando muito, era avistada pelas sombras do beco. E não quis mais voltar ao lar. E foi seguindo de beco em beco, de escuridão em escuridão, até desaparecer nos caminhos.

Escritor

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