Um certo olhar...
Seria muito bom, ou melhor, seria óóóótimo se ele latisse bem alto, uivasse, rosnasse, acabasse de acabar com meu tênis e minhas meias, mordesse meu calcanhar até mesmo marcasse ainda mais o território dele nas minhas canelas.
Mas, não! A tática dele é simplesmente irritante! Ele se posta num canto e fica numa posição de Sesheps, a esfinge de Gizé. E tão petrificado quanto a própria figura mística usualmente tida como um leão estendido com uma cabeça humana, geralmente a de um faraó, vista como guardiã na estatuária egípcia e que adorava devorar (ou estrangular, de acordo com a palavra esfinge, que deriva do grego sphingo) quem passasse por ela e não decifrasse seu famoso enigma.*
Enquanto estou sentado à frente do notebook preparando as publicações do ROL, do Inter-NET Jornal, fazendo revisões de livros ou escrevendo uma crônica, lá está ele, me dirigindo aquele olhar de Mandrake; um olhar que, nos primeiros momentos, parece normal, mas, com o decorrer dos minutos, parece uma âncora de chumbo. Ele não move aqueles olhos um grau à direita, à esquerda, para cima ou para baixo. Simplesmente mira-o em mim, feito um míssil intercontinental. E com uma ogiva bem radioativa!
O que ele quer com isso? — certamente alguém pode perguntar. E eu respondo: ele quer sair e ‘marcar território’, numa ‘sanha mijatória’ sem precedentes (na bixiga dele deve ter uma piscina olímpica de mijo)! Ah, e ver e, de preferência, interagir com gatos! Ele tem obsessão, adora gatos (na foto anexa, ele em pé, escaneando pra ver se acha algum)!
Agora, imagine estar preparando uma publicação, ou revisando um texto e, com o canto dos olhos, de soslaio ver, ou melhor, sentir aquele olhar que parece uma bigorna pousada no pé (e justo no que tem um antigo e doloroso calo!) ...
E aquela batalha silenciosa perdura, permanece, persiste até o momento que a vontade é sair gritando e arrancando os poucos fios de cabelo que ainda restam da devastação capilar que o Senhor Tempo promoveu sobre meu ‘telhado’.
Finalmente, entrego os pontos e cedo àquele olhar mandrakiano. Desligo o notebook (P.Q.P! Esqueci de gravar o último texto! Um texto que durou 3 encarnações pra eu escrever!), respiro bem fundo (até me dar tontura) e lá vou eu pra dar atenção ao fleugmático peludinho (não sem uma vontade irresistível, confesso, de dar uma leve, levíssima sphingoladinha nele).
Ah, este texto inicial da minha nova coluna (Sergíssimas) já está chegando ao fim e eu já estava me esquecendo de apresentar o meu peludinho, que, não obstante testar meus nervos diariamente, é meu fidelíssimo companheiro (inclusive das recorrentes insônias) e que já me rendeu outras crônicas saborosas.
Seu nome é Tobby! E, segundo uma pesquisa genealógica ainda não feita pelo nosso querido amigo e irmão Afrânio Mello, também colunista do Inter-NET Jornal e do Jornal Cultural ROL, descende da nobilíssima família italiana dos Tobberino Tobberone.
Por um desses desastres naturais da vida, com dois meses de idade encontrava-se abandonado. Postada uma foto dele no Facebook, foi amor à primeira vista!
Atualmente, conta com seis anos de idade. E espero que viva, e bem, até depois que eu partir deste plano terreno, porquanto não consigo viver sem esse olhar feito uma âncora de chumbo me convidando silenciosamente para passear, para ver e sentir a natureza, e, com isso, celebrar a vida!
* A esfinge era um monstro alado com corpo de mulher e leão que afligia a cidade de Tebas. A todos os caminhantes que passavam por ela os inquiria com o enigma: “Que animal anda pela manhã sobre quatro patas, a tarde sobre duas e a noite sobre três?” Isso ocorreu até que Édipo, filho de Laio enfrentou a esfinge e conseguiu decifrar seu enigma respondendo: “O homem, pois engatinha na infância, anda ereto na idade adulta e necessita de bengala na velhice”.