ENTRE BEETHOVEN E JACÓ DO BANDOLIM
Vesti meu terno azul marinho de alpaca, impecavelmente passado pela própria governanta, com o colete bem cortado pelo alfaiate tradicional de família: camisa branca, barbatanas no colarinho engomado, abotoaduras de ouro, com monograma, gravata de seda italiana realçada pelo alfinete de pérola, lenço branco de seda no bolsinho externo superior do paletó, calçado social preto de cromo alemão, com o relógio suíço folhado a ouro no bolso do colete. Apanhei a bengala com cabo de prata e coloquei a indefectível manta branca e franjada de seda, pois fazia frio. Achei que estava adequado para o sarau na mansão dos Mendonça y Alcaparras. Haveria um recital de piano com obras de Villa-Lobos, antes da ceia. Mirei-me novamente no espelho grande do “closet” e me contentei com a imagem refletida: era, afinal, “o prato da casa” - nada melhor poderia oferecer, e nem seria necessário, diga-se. Por segurança, reli o convite personalizado em letras góticas douradas. Desci para aguardar a chegada da Limusine, conduzida pelo “chauffeur” asiático de confiança. Foi então que acordei, me lavei, pus a bermuda de brim surrada, uma camiseta desbotada, o chinelo de dedo e fui para rua bem feliz passear com os quatro cachorrinhos.