Palavra Solta – cada letra

Palavra Solta – cada letra

*Rangel Alves da Costa

Escrever é um ato de solidão. Mas também de amor e devoção a cada letra, a cada palavra, frase, ao contexto do escrito, enfim. Escrever não é atitude de profissão nem ofício mecanizado ou alheio aos sentimentos. Escrever é ato de criação, é gestação artesanal, é dar sopro de vida ao que vai brotando na junção das letras e das palavras. Escrever é gestual de santeiro, de seleiro, de ferreiro, de bordador, de doceiro, pois tudo no cuidado do talhe, do entalhe, do detalhe, do remendo, da emenda, da costura, do fazimento inteiro de cada retalho. Escrever é ter à mão um cinzel e ser um Mestre Tonho no seu ofício de criação. Escrever é ser um Orlando dos Couros perante os seus moldes, seus cortes e recortes, suas costuras na pele dura. Escrever é como arte e ato da jovem Sara, de Dona Domingas, de Cenira, de Dona Conceição de Laura, todas bordadeiras, sendo cada bilro como um lápis que faz surgir a escrita. Escrever é como ter a fé e a devoção de Dona Zefa da Guia, pois tudo gestado entre o natural e a força superior da criação. Escrever é como ter o esmero e cuidado da doceira Naní. O açúcar, a medida de sal, o ponto. Escrever é como ter o silêncio da saudade e o sentimentalismo do poeta. Nada nasce sem uma pitada de angústia, de nostalgia, de aflição. Escrever é como tocar um lábio amado, beijar um corpo macio, fazer amor e sentir prazer. Ou a paixão emerge no pensamento ou nada será criado como algo que mereça ser lido. Escrever é ser barqueiro, canoeiro, ribeirinho das águas. O barco repousa na mente, nos beirais do pensamento e das ideias, para depois de repente sair, partir, navegar...

Escritor

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