CONCORDAR SEM AO MENOS ACORDAR
CONCORDAR SEM AO MENOS ACORDAR
Tudo na vida de um ser humano precisa de definições sobre o que realmente queremos. Até quando nos deparamos com situações em que temos que escolher caminhos a trilhar, são nossos conceitos e preconceitos sobre a vida que nos dão o diapasão necessário para trilharmos o caminho que, em tese, seja mais coerente para nós e o nosso projeto existencial.
Nesse contexto, podemos dizer que eventualmente teremos que fazer escolhas, diferentemente das outras espécies animais, em sua maioria, as quais se valem dos instintos naturais. E essas escolhas perpassam pelo simples fator de concordância ou discordância.
Todavia, concordar não quer dizer que seja algo que realmente queremos, desejamos ou pretendemos, pois pode ser que estejamos mergulhados num oceano abismal, no qual essa vontade que estaremos expressando momentaneamente pode vir turvada pelo impacto da densidade altíssima e compactante, que esse abismo mais do que quilométrico abaixo da nossa atmosfera de vida nos estará a influenciar, nos deixando realmente sob o limbo do dormir profundo, desacordado para o tudo que nos invade o cotidiano e está a nos influenciar ou a nos envenenar, sem termos nem a chance de buscar os soros antiofídicos necessários e correlatos.
Concordar sobre certas circunstâncias pode ser o mesmo que lagartixar, já que as pequenas répteis têm o costume de balançar as cabeças de baixo para cima e vice-versa, como se isso fosse um gesto de aceitação e não de contraponto ao que se está sendo proposto.
Concordar, então, precisa de um estado de espírito que demande o estar acordado, aceso, pulsante, intrigantemente questionante, pois sempre será preciso se buscar o que está por trás das cortinas de cada palco ou trupe a se apresentar, seja teatralmente ou realmente, para nós e todo o público que nos cerca ou nos acompanha.
Estar dormindo e ao mesmo tempo concordando é como se estivéssemos em frente a uma platéia em assembléia, onde todos fossem surdos e ao mesmo tempo estivessem sendo convocados verbalmente a se posicionarem sobre quaisquer que fossem os assuntos em debate. Estaríamos buscando a concordância sem a possibilidade de questionar, de inquirir, de debater o verdadeiro porquê inquirido. Seria o concordar onde diríamos ao público presente que bastaria se calar para aceitar, buscando um resultado premeditado e induzido.
E assim, estaríamos dormindo para algo que nem sempre representaria o nosso verdadeiro querer, desacordados como se tivéssemos furado o dedo com o tear maligno da maga, no conta da Cinderela, mas sem a possibilidade de termos príncipes encantados para reacordar, pois na verdade dos fatos, não poderíamos dormir por cem anos e acordar como se congelados estivéssemos, pois a vida na terra ainda não chegou a este almejado estágio.
As plantas hibernam, juntamente com os ursos e outros animais, mas o ser humano carece de vida que se agita constantemente, para impor o nosso querer ou o nosso almejar, mesmo quando dormimos para descansar, quando os sonhos nos embalam projetos, visões ou reflexos do tudo que acontece ao nosso redor, mas que nem sempre conseguimos trazer para o nosso cognitivo formal, nos levando a agir como se intuitivamente fosse, sobre coisas que realmente o fazemos por termos vivido ou percebido as coisas acontecerem sem estarmos plenamente acordados para isso.
É como o campo espacial que temos na nossa visão ocular, que registra a tudo o que acontece no alcance da íris, mas só nos deixa lembrar facilmente o que está no centro de visão, na busca do foco que nos levará aonde nos predispomos inicialmente. E isso faz com que, algumas vezes, estejamos a dizer que já vimos algo que não lembramos, ou até que simpatizamos com algo sem saber o porquê. E vem aquela sensação de impotência perante o destino, pois nos vemos não mais como meros meninos, que se querem ver senhores e senhoras do nosso porvir, mas a bem da verdade só podemos dominar o agora, pois o resto sem demora vem a nos surpreender.
Assim, é preciso nem sempre discordar ou concordar, mas que o que aceitemos como verdade para as nossas vidas, o façamos acordados, pra não sermos enganados pelos que nos querem seduzir para só usufruir da nossa inocência tão silvestre, tão brejeira, ou rupestre, que traduz apenas o que os instintos permitiram registrar nas rochas das encostas e cavernas do outrora da humanidade, onde a nossa contenda era contras as bestas horrendas ou a natureza rude que agia para tudo avançar.
Hoje, já não temos essa inocência pueril dos antigos hominídeos, mas a história e as estórias relatadas nos ensinam que nem tudo que se vê acontece realmente, pois pode ser mais um pesadelo ou um sonho que tivemos, acordados ou dormindo, mas só vendo o destino que tantos povos ou pessoas tiveram por deslizes que alguns outros tiveram no agir. E assim foi que o destino agiu com Cleópatra, Júlio Cesar, Nero, Napoleão, Aníbal ou Páris. E também se foram nas areias do tempo os impérios do Egito, Roma, Cartago ou Troia, que por ações temerárias ou erros capitais de estratégias almejadas, viram homens e nações ruírem e se findarem antes dos ciclos a que se propunham existir.