Palavra Solta – o trem e a estação

Palavra Solta – o trem e a estação

*Rangel Alves da Costa

. Talvez mil anos assim, uma vida inteira ante o relógio da estação e a espera infinita do apito, da fumaça, do cheiro de flores, dos sorrisos ou das lágrimas. Talvez até que seja eu na desilusão de meus dias. Já não sei se trem de partida ou de chegada. A estação sempre vazia, triste, silenciosa. Os bancos desocupados, folhagens dançando pelo chão de terra. A ventania chegando e trazendo poeira, um cachorro latindo, uma saudade distante. Um cheiro diferente no ar. Não sei se de fumaça do trem ou da aparência antiga e maltratada do lugar. Mais de mil anos de adeuses, abraços, despedidas. De um lado, ao longe, apenas a curva da montanha entreaberta para sua passagem; do outro, onde o olhar vai se perdendo na finura dos trilhos, apenas uma cor sombria de desalento. Os trilhos não deixam marcas, não indicam da proximidade ou da já distante partida. Nos encaixes, madeira velha divisando o percurso, nenhum sinal de calor do instante. O trem ainda não veio dessa vez. Talvez nunca venha. Apenas a memória correndo nas vagas daqueles trilhos rumando ao nada.

Escritor

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