NAQUELES TEMPOS, NAQUELA FESTA

NAQUELES TEMPOS, NAQUELA FESTA

*Rangel Alves da Costa

Hoje está muito diferente. Do que restou de outros tempos somente as missas, os ofícios religiosos e a procissão no dia 15, principal data e marco final das comemorações alusivas a Nossa Senhora da Conceição, padroeira do município de Poço Redondo, no alto sertão sergipano do São Francisco.

Ainda alguns parques, alguns brinquedos para a criançada, algum evento diferente e animador para a população. Mas não mais do que isso. O velho foi dando lugar a um novo cada vez mais desalentador à cultura, à história e às tradições de um povo. Um novo que já chega descaracterizado e embaça de morte a identidade de um sertão inteiro.

Com efeito, a juventude de agora só pensa em música eletrônica, em paredões, em músicas que nada tem a ver com o sertão. Mesmo as ditas bandas de forró, nada de forró têm a sua música, pois apenas uma sofrência insuportável de se ouvir ou baladas de péssimos gostos, com letras vergonhosas e refrãos sempre repetidos sobre a cachaça, dor de cotovelo e cornice.

Ao invés de forró ou de grupos regionais, ao invés da música de raiz ou dos sons encantadores dos pífanos, essa juventude vai buscar satisfação no modismo musical estarrecedor. O problema é que a festa inteira é como que em atendimento a uma juventude descompromissada com sua autenticidade e suas raízes. Nem pensar em música que faça dançar agarradinho, em canções que tragam saudades ou em ritmos que vão além das modernas percussões eletrônicas.

Noutros tempos, já desde mais de semana que o forró comia no centro. Ali sim, era uma Festa de Agosto mesmo, amada e respeitada. Gente chegando no lombo do burro, em cima de jegue, por riba de cavalo alazão e até de pangaré. Pão de Açúcar, Serra Negra, Delmiro, Piranhas, Paulo Afonso, visitante de todo o sertão e mais distante.

Em toda casa havia uma ninhada de amigos, de visitantes, de gente chegada afoita por um bom arrasta-pé, um autêntico forró pé-de-serra, um chinelado de estremecer salão desde o amanhecer à madrugada seguinte. Zé Aleixo, Zé Goití, Dudu Ribeiro, Agenor da Barra, Raimundinho e até Durvalzinho.

No Salão da Prefeitura, no Bar de Delino, na Casa de Veinha, no Bar de Missião, por todo lugar. Não havia salão ou sala de reboco onde uma sanfona não gemesse e o povo acorresse festivo e animado. Era o fole gemendo e o povo suado sem parar de tanto dançar. Também os bailes no mercado, as orquestras e as bandas renomadas: Embalo D, R Som 7 e Dissonantes, quem não recorda?

E de repente vinha Heleno Silva de Monte Alegre, mais conhecido como Boca Rica, e hoje um famoso pastor, dando uma de cantor. E cantor de música internacional: "There was a place that I lived/ And a girl, so young and fair/ I have seen many things in my life/ Some of them I'll never forget... Oh my mistake...".

Mas que saudade agora, saudade grande do amigo Miltinho. Quanta falta faz este homem ao sertão forrozeiro. E quanto mais a festa se mostra como está mais a gente sente falta. Que saudade grande, que saudade de tudo. Hoje em plena festa e é como se nada mais existisse daqueles tempos de glória.

Não há mais forró. Não há mais zabumba, triângulo, pandeiro e sanfona. Não há mais a voz bonita do cantador. Apenas os paredões tanta nas ruas como nos palcos. Uma lástima. Mas é o que se tem antes que fique pior. E certamente ficará. A tendência de tudo é a completa perda de identidade e a descaracterização total. Até que o povo sequer se reconheça mais em si mesmo.

Eis as lições dos velhos tempos e dos tempos de agora.

Escritor

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