A VIDA COMO ELA É

Já havia algum tempo que eu e a ex-mulher decidíramos inapelavelmente a separação, mas era questão economicamente complicada, já que teria de pagar pensão alimentícia, sair de casa e conseguir um novo ninho. O ano de 1988 não estava favorável. Conversei com o velho pai, que tinha um apartamento ideal, mas alugado. Ele me disse: “o aluguel vai até o fim do ano, se conseguires desocupá-lo, podes ficar por lá, basta pagar IPTU e Condomínio”. Restava-me a tarefa de tentar convencer a locatária. Era uma engenheira de alto nível, bonita, charmosa, inteligente, solteira, da minha idade, talvez um ou dois anos menos. Conversamos bastante, umas bebidinhas para aquecer e acabamos saindo para jantar, dançar, o comum da vida, enfim. Depois de umas duas semanas, tive sorte, pois ela conseguiu apartamento no mesmo edifício, mesmo preço, em outro andar, e topou a rescisão contratual. Com minha irmã Vera desempenhando importante papel de assessora, fiz várias incursões na Avenida Osvaldo Aranha e consegui móveis novos por bons preços, cama, sofá-cama, armários, coisas do tipo. Comprei eletro-eletrônicos básicos, utensílios, louças, lençóis, cobertores, ganhei alguns presentes familiares de utilidade e decoração e já no mês de agosto de 1988 estava praticamente pronto para uma nova vida, inclusive acolher os filhos. Foi um inverno muito frio e os aquecedores elétricos não faltaram (aparelhos de ar condicionado vieram só um bom tempo depois). Sem telefone da estatal CRT, é claro, pois o preço rondava dois mil dólares, no mercado paralelo. Trabalhava muito: Escritório, Banco e, à noite, aulas na PUC. Foi um começar de novo aos quarenta e poucos anos, mas já com uma carga forte de responsabilidades e compromissos. A locatária, já bem instalada em seu novo canto, também me deu algum assessoramento estético. Mulheres são fundamentais à vida de qualquer homem. Honra também a meu irmão Ricardo, que, no primeiro fim de semana em que recebi os filhos, dormiu por lá, pois havia razoável espaço, e fez frituras na cozinha para nosso razoável alimento, enquanto assistíamos a filmes tirados em locadora. Foi uma noitada bem divertida, que emprestou alegria a um novo jeito de viver.