HOMENS BONS

É um tanto raro encontrar, mas existem vários homens bons, gentis, doces e afáveis. São pessoas que praticamente nunca perdem a compostura, sempre dispostas a apoiar, a compreender e a encaminhar problemas da mais terna forma imaginável. Meu pai era parecido com aquele protótipo do indivíduo “faca na bota”, como se diz por estas bandas, e eu sou relativamente belicoso, sob o manto da gentileza e da elegância. Sem excessos, naturalmente. Por outro lado, meu avô materno português, José Simões de Matos, Seu Matos, era a bondade em pessoa. Chegava a ser comovente. Claro que teve seus momentos guerreiros ao imigrar para o Brasil aos 17 anos de idade, muito pobre e sem arrimo. Andou por muitos cantos, foi mascate em lombo de mula, motorneiro no Rio de Janeiro e garçom, casou-se, pela primeira vez, em Pelotas, com uma prima, teve uma filha, mas a esposa e filha em pouco tempo vieram a falecer, assim como os sogros. Dedicou-se ainda mais ao trabalho árduo. Depois, já casado com vó Dina, tornou-se líder e doutrinador espírita, com livros publicados. Foi Presidente da Federação Espírita do RS e dedicadíssimo ao mister espiritual. Amigo de Chico Xavier, insistia para que eu ouvisse, pelo rádio, as palestras do jovem Divaldo Franco, que já despontava no universo espírita do Brasil. Seu Matos foi um autodidata de respeito. Mas meu objetivo é assinalar o jeito ameno de ser. Uma de suas máximas, que repito aqui na sua peculiar pronúncia portuguesa, era “não contendeire”, quer dizer, não contender, procurar não alimentar desavenças e conflitos. Jamais segui à risca. Não dizia palavrões e nem se referia a tipos ordinários de modo agressivo. Dizia simplesmente que eram uns “indrómitas”. Já pesquisei e nunca achei qualquer referência ao vocábulo. A sua diretriz, em suma, era “ignorar os indrómitas para não contendeire”. Ele tinha fundadas razões, reconheço, mas ficou em mim a imagem do velho pai com o 38 na cintura. Ele também era um homem bom e correto: segundo nebulosamente lembro, sacou do revólver uma vez para forçar um barqueiro a atravessar com nosso automóvel um rio, à noite, em época de cheia e chuvarada, pois minha pequena irmã Vera estava quase à morte e tinha de ser hospitalizada com urgência em hospital de cidade sita na outra margem. Em outra feita, já narrei e até participei, foi quando calçou o “garanhão” que se divertia com a empregada nos fundos da nossa residência em Encantado.