O RETRATO DE DONA ARACI
O RETRATO DE DONA ARACI
*Rangel Alves da Costa
Sua sobrinha Aline Feitosa encontrou e postou, ainda em 2015, uma indiscutível preciosidade: um retrato de Dona Araci Feitosa. E mais: em pleno e singelo ofício da renda de bilros.
Pelo retratado na fotografia, o local da feitura da renda é em sua própria residência, na sala da frente, com um olho para o corredor da cozinha e outro para a porta da frente, em direção tanto à rua como à Praça da Matriz.
A casa ainda é a mesma, continua quase na mesma feição daquela dos tempos idos e deixada por Dona Araci quando disse adeus e partiu no dia 07 de agosto de 2004. Seu filho Gildo não quis permanecer no lar familiar, deixando a moradia àquela que mesmo sendo sobrinha sempre conviveu com a tia Araci e por esta sempre vista como verdadeira filha: Bezinha.
Avistar novamente Dona Araci é como mais uma vez folhear um majestoso álbum, não apenas familiar como da própria história de Poço Redondo. Do tronco familiar dos Feitosa e dos Cardoso, das raízes primeiras do Poço de Cima, pois filha de Seu Marcionílio Feitosa de Sousa e de Dona Izabel Cardoso dos Santos (Iaiá). Irmã de José Feitosa Neto (Zé de Iaiá), de Dom (Mercedes Feitosa), de Bené, de Isaura, Clotilde, Dedé, Bebé, Jovino e Maria de Miguel (a mesma Maria de Iaiá), Dona Araci se aposentou como funcionária pública municipal, eis que sempre prestando serviço na sede da prefeitura e desde que a mesma funcionava no atual local da Câmara dos Vereadores.
Pessoa simples, sempre bondosa e cativante, conviveu com o prazer de ter uma infinidade de amigos. Gostava de dedilhar sua renda na sala de casa, em cadeira colocada quase na porta da frente, mas de vez em quando era avistada na calçada com seu ofício ou mesmo mais adiante, nas tardes de brisa boa na calçada da prefeitura, ao lado de sua irmã Dom que, morando em frente, também levava sua almofada de renda para os lados do sombreado.
Morando na parte mais central da cidade, Dona Araci tudo testemunhou dos passos do seu sertão. Da casa humilde de janela e porta, bastava olhar adiante para avistar o sertanejo mundo. Aquilo tudo via, aquilo tudo sentia. E hoje, restando na memória e na saudade sua, e tudo fruto de um adeus que já se faz distante, ponho-me a imaginar o que se passava na cabeça de Dona Araci enquanto, no silêncio das horas, ia tecendo sua renda. De cabeça voltada para a almofada e pensando o que? Toda a história de Poço Redondo.
Isso mesmo, rememorando aqueles tempos idos de seu sertão: tempos cangaceiros, tempos de bonanças e de secas grandes, tempos de amizades e de um sertão como uma só família. Coisas hoje amareladas no calendário do tempo, ou mesmo já completamente esquecidas, mas que, como numa colcha de retalhos, foram se unindo para contar nossa história.
Em Poço Redondo não há uma rua ou outro logradouro com o seu nome. Os legisladores sempre se esquecem dos importantes vultos da história local. Mas o povo não. O povo reverencia sua história e sua memória, assim como se faz no legado de Dona Araci.
Escritor
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