O SISTEMA

Os que me conhecem sabem de minha formação legalista. Nem vou tecer comentários curriculares a respeito. Este texto destina-se tão somente a chamar atenção sobre quem vive em outra dimensão, praticando diferente “modus operandi” e não estão presos – nem serão – e vivem bem, dentro de circunstâncias que os agradam ou que não lhes prejudicam o dia a dia. São algumas pessoas que conheço assim, que sobrevivem à vontade absolutamente fora do sistema ou parcialmente alheias a seu fluxo regular, conforme conveniências. Você também conhece. Há os que nunca pagam tributos há muitos anos, descumprem normas legais de todo tipo, resolvem seus problemas através da justiça com as próprias mãos e, quando, esporadicamente, enfrentam algum processo, cometem o que necessário for para usufruir da comodidade e da lentidão inerente ao nosso sistema legal. Aliás, em outros tempos, em países desenvolvidos, foi o que ensejou a pujança da COSA NOSTRA e de outras organizações. É, também, o espaço amplo em algumas aglomerações populares que abriga a bandidagem brasileira. Quando o Estado é ausente ou benevolente com a corrupção, a “justiça” – mais rápida e eficaz – deixa de ser monopólio público e migra para setores mais organizados e poderosos, à margem da lei, pois não há grande diferença ao sobrevivente. Mas, nos círculos de classe média, sem qualquer liderança ou bandeira, há também os que não aceitam burocracia, disposições normativas ou momentâneas e nem sempre bem-vindas autoridades: levam a vida do jeito que acham melhor, contam com a sorte e com a debilidade institucional. Há casos impressionantes de longa vida bem vivida sem maiores concessões ao Sistema. Não julgo ninguém, se fosse julgar, teria de começar pelo próprio sistema. Você não sabe, mas talvez tenha um conhecido ou amigo, por exemplo, que jamais pagou um tostão furado referente a imposto, taxa, multa ou seguro por determinado bem. Dirigir bêbado é banal, o noticiário jornalístico nos traz muitos e muitos casos, seguidamente. Preconceitos, posturas cívicas e democráticas? Urbanidade? Fraternidade? Não sou pessimista, mas a geração de filhos e netos terá ainda de enfrentar muitos desafios. Falar mal de político é até engraçado, pois eles são a nossa fotografia, receberam o voto democrático. Num clube recreativo, em certos condomínios residenciais, em associações corporativas, você percebe eventualmente absurdos, o que não acontece num país continental de enormes desigualdades como o nosso? Tarefa, no mínimo, para mais meio século!