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Por Leont Etiel 

Gostava de dizer agora, já que sei que, do futuro, não há como enviar notícias. Não só porque o ‘futuro dura muito tempo’, mas porque não haverá hipótese de comunicação. Encontrar-se-á no plano do ‘já não está’, e não ‘do é’. Não haverá possibilidade sequer de lembrar do peso contínuo que habitou a vida ou talvez de uma suprema graça última, a título de despedida, que animou alguma alegria revelada.
Dói-me ouvir-te lamentar e sofrer com as dores que as fraquezas da estrutura óssea do teu corpo passaram a provocar nele. Dizes que é assim mesmo, que é quando o tempo já começa a apertar. Desejava imenso que não o fosse. Falas com a mesma serenidade que tinhas na mocidade, naqueles piniques na altura das férias da Primavera.
Acredito que lembro praticamente todos os detalhes sobre eles. Quase sempre me levavas à pequena vila, ao fim da tarde, para ‘olhar o trem passar’. Do apito de quando ele se aproximava ficou-me na memória o barulho das carruagens sobre os trilhos, junto com a singela movimentação das pessoas na estação a arrumarem as bagagens para tomarem o seu destino. Após o apito anunciar a partida, tomávamos o destino crepuscular do dia que findava.
Já faz tanto tempo, mas é tudo tão vivo. Entretanto, agora estás aqui a dizer-me que esse tempo te aperta, e desatas a me fazer recomendações, no pressuposto da finitude, do ‘já não ser’. De que devo ter cuidado, do que devo cuidar.  Não me ponhas a pensar em coisas da transcendência! Ossos terás ainda agora, como dantes, para te manteres na estrada. Eles, os ossos, estão apenas, coitaditos, um bocadinho cansados, pois já há muito que tu caminhas, e com uma fibra que não é para qualquer vivente.
Lembras-te tu agora do que tantas vezes me disseste quando olhávamos as estrelas, nos dias de Verão que prosseguiam noite adentro.  Que, ‘no meio da paz noturna’, podemos encontrar as chaves para abrir as portas que estão fechadas em nós mesmos. Estas são as palavras que não te quero dizer escrevendo do inquieto desalento de paragens futuras.