CASAMENTOS EM CRISE
Que fique muito claro que não estou me baseando em nenhuma relação conhecida. Ou, se quiserem, estou encarando o assunto num plano mais amplo, norteado pela grande maioria dos relacionamentos que conheço. Enfim, no início tudo é romântico, com muita adrenalina, carinho e sexo, planos empolgantes, eletricidade epidérmica, cumplicidade e, mais cedo ou mais tarde, o casamento, com o desfrute da festa para a alegria dos nubentes e familiares. Não tem escapatória, o casamento – que se deseja alcançar como meta – tem todo este valor, mas é instituição cultural, social e juridicamente pesada. A rigor, é nosso maior compromisso. Príncipe e Princesa, quem sabe futuros sapos, almejam uma associação bonita para a formação de família, especialmente filhos, intimidade, acomodação, parceria, aventuras conjuntas, novos parentes e vida tranqüila para o trabalho produtivo. É a regra da inserção social no sentido tradicional: uma maravilha, com namoro e animação por todos os poros. Depois, nascem os filhos, glória das glórias, realização máxima do ser humano. Talvez uma nova casa, um carro novo mais adiante, viagens, desafios a vencer, que nos enaltecem. Amor, ternura, projetos mais arrojados, a felicidade plena chegando para atingir outro patamar de vida. Tempo passando, eventualmente a explosão de alegria pelo segundo filho. Desafios e sacrifícios crescentes. Mas aí estamos por volta de oito anos de vida matrimonial. As relações com parentes já não têm o mesmo frescor, despesas e encargos pessoais aumentam, a casa necessita reforma, é preciso trocar de carro, renovar os móveis, o trabalho é estressante e a vida doméstica mais ainda, com desacertos na divisão de tarefas domésticas. O orçamento familiar impõe limites aos anseios. O homem, ou a mulher, que era um doce e apaixonante, passa a incomodar, os filhos demandam muito e os casais vão perdendo lentamente as estribeiras. O sexo transforma-se quase em acidente de percurso ou obrigação de calendário. Aí avultam as separações, os filhos pagando o pato. Não interessam os motivos, já que são interdependentes: cansaço, mau humor, temperamentos que se descontrolam. Acontece seguidamente, mas a separação açodada é bobagem, já que tudo isto é normal numa vida a dois. Só o passar do tempo ensina. Em qualquer sociedade, as dissensões e as crises acontecem, mesmo entre irmãos ou até entre pais e filhos. A vida é complicada mesmo. Separação não é o fim do mundo, em certos casos inevitável e até necessária, mas, via de regra, a precipitação é típica da modernidade, impregnada de individualismo e ânsia pelo tal do “quero ser feliz”. Quando o casal decide pelo vínculo matrimonial tem de saber que a vida irá mudar e que passará por “poucas e boas”, como se diz. A ficção romanesca do “viveram felizes para sempre” requer leitura mais realista. Mas, se você, já em grau amadurecido, estiver sem companhia estável, você é também muito feliz e talvez nem saiba quanto. Se desfrutar a vida numa boa, sem ansiedade e com prazer, será referência preciosa para muito casal de fantasia. Minha conclusão é a de que só vive bem quem está feliz consigo, casado, solteiro, separado ou viúvo. No mais, é pura telenovela.