Pense só, como eles abusaram
Eu me apaixonei pelo jeito de falar da Maria. Pelo seu sotaque, pelas palavras que Maria usa, algumas delas em sentidos tão diferente dos que eu estava acostumado. Mas agora, agora construíram essa parede e eu não posso mais ouvir Maria falando, brincando com seu irmão, com seu cachorrinho Pedrito, ou cantando. Aliás, para meu completo deleite, muitas das vezes, inventando suas próprias canções!
Como diria a própria Maria, eles abusaram! Pense só, como eles abusaram, levantando a droga dessa parede!
Agora, mesmo quando fazem dias quentes de céu clarinho, mesmo com os falsos pés de girassóis do outro lado da rua – e toda aquela sua boniteza amarela para se observar da janela – mesmo assim, minhas tardes ficaram tão tristes sem poder ouvir a voz de Maria! Sinto como se tivessem erguido um Muro de Berlim entre nós. Maria ficou do lado ocidental, eu fiquei do lado oriental.
Antes, quando não estava fazendo esse frio, e os pedreiros ainda assentavam os primeiros tijolos, Maria espiava meu quintal, quando eu a via e a cumprimentava, ela me sorria de volta um sorrisinho encabulada lindo de morrer. Como era bom acordar, sair para o quintal e simplesmente ter só pra mim o sorriso tímido de Maria lá no alto de sua laje!
O jeito é ficar por aqui, ouvindo Ivan Curi, O retrato de Maria, e lamentando a vida sem a minha encantadora vizinha!