Tudo dependera da flexibilidade do rabo lagartixa
Tudo começou quando esses dois nordestinos, um paraibano e uma pernambucana, recentemente chegados a Selva de Pedra em meados da década de oitenta (a qual acreditavam ser o paraíso), se conheceram fortuitamente e resolveram do dia para noite, amancebar-se.
Resultado, sou um dos filhos desse casal. Filho de pai analfabeto e mãe semianalfabeta, nascido em São Paulo, capital, no dia 5 de novembro de 1986. Época em que meu pai trabalhava em um prédio próximo à rua da consolação, mas logo, não sei ao certo por qual motivo (ou quais motivos), nos mudamos para Baixada Santista, onde nasceu minha única irmã. Eu e ela temos dois anos de diferença de nascimento de um para o outro.
Vivemos por pouco tempo em Santos. Segundo minha mãe, “por conta das bebedeiras e jogatinas de meu pai”, tornamos a subir a serra de mala e cuia. Dessa vez o destino era Guarulhos, Bairro, Jardim Fortaleza.
Para não deixar de parafrasear Mario Quintana, “fazem trinta e dois anos e mais alguns tantos dias, que eu não morro”. Trinta desses anos, vivendo aqui, nesse lugar onde frequentei a escola até completar o ensino médio e brinquei despreocupadamente nas ruas quando criança. Bebi pinga sentado nos bancos de praça, passei a me preocupar com as coisas da vida, fui salvo pelos livros e tomei gosto por escrever, quando adolescente. E muito a contragosto, conforme o tempo, sem que eu notasse, foi passando, me tornei o adulto que sou hoje, esse, o adulto pagador de boleto, estudante de História, trabalhador autônomo, Ajudante de Montador de Forros e Divisórias. Ui!
Lá na firma eles me consideram esquisito, para não dizer coisa pior, que eles também acham e discutem sobre mim, pelas minhas costas. Isso, só porque, entre outras coisas, eu não tenho a ganância de querer sempre ganhar mais e mais dinheiro. Bem, eu realmente poderia me esforçar para ganhar mais dinheiro, vá lá, se todo o labor e tempo que teria que despender, não custasse a minha liberdade, preço que não estou disposto a pagar. Prefiro ser livre do que rico. É uma troca. Ao invés de encher a carteira de dinheiro, nos dias que não precisam de mim, fico cá com meus livros, meus filmes, minhas músicas, enchendo a cabeça de conhecimento... Clichê? Romantismo? É, eu sei. Talvez. Mas as coisas funcionam mais ou menos assim mesmo pra mim. Essa é a forma como penso e levo a vida. Decerto eu deveria ter um plano B. Talvez eu tenha. Talvez eu realmente tente dar aulas de História quando me formar. Não sou muito bom em lidar com gente, mas que sabe eu me descubra nisso.