RESPEITEM OS MAIS VELHOS

Dito assim parece careta, talvez alguns mais velhos nem mereçam consideração, mas estou falando de geração, de história, sofrimento e luta. Quando a gente mergulha no passado familiar, descobrem-se atos inolvidáveis e exemplares de bravura e sacrifício ou dramas decorrentes da pobreza, ignorância, humildade e dor, que nos dão uma compreensão maior do que somos e do quanto devemos a tantos. Hoje, é verdade, tudo é mais dinâmico, existe muita concorrência, novos desafios e apelos. É gente demais buscando espaço, mas vocês precisam ter idéia da batalha travada no “tempo das cavernas”, quando predominavam o preconceito, a carência de recursos tecnológicos e materiais, o autoritarismo, a escassez, as distâncias e a lentidão do progresso. Tudo, enfim, era mais demorado, penoso. Ainda peguei um pedacinho desse tempo. Vejam a carreira suada e sofrida dos artistas sem palco e pouco público, dos médicos sem recursos técnicos, dos advogados de porta-de-cadeia, dos juízes mal remunerados. E o que dizer dos operários de poucas fábricas e baixos salários, dos comerciários, bancários e outras categorias com tantas obrigações e poucos direitos?! Na vida social, as mulheres não ostentavam sorrisos perfeitos de aparelhos ortodônticos e não se fazia plástica para corrigir nariz adunco ou particularidades outras. E eram cidadãs de segunda classe, para dizer o mínimo, pois só tiveram direito ao voto em 1932. Cada um se defendia nos limites da natureza e das condições econômicas, sem automóvel, roupas de grife, clínicas estéticas, código do consumidor e tantos outros recursos, institutos e apetrechos da modernidade. Bom cantor tinha voz sempre, sem a fraude dos “play back”. No vestibular de direito, fazia-se também exame oral, prova de latim e escreviam-se laudas de papel almaço na prova de filosofia. Talvez agora pareça pouco, irrelevante, mas sem leitura de muitos e muitos livros era tarefa impossível. Muita gente passou necessidade para concluir um curso ou vencer concurso público. Doaram suor e sangue. Outros ralaram demais para abrir negócio ou atividade autônoma, necessitando preservá-los das inúmeras crises econômicas, nadando de poncho contra a correnteza. Sem falar das restrições estabelecidas pelos pais e maridos e dos preconceitos de uma sociedade arcaica, patriarcal e autoritária, que resistia a transformações e a novidades. Lembrem-se, o homem era o chefe da sociedade conjugal e mandava nos filhos e na mulher. Tempos de conflitos, aflições silenciosas ou, eventualmente, gestos de arrojo. Relendo as “HISTÓRIAS QUE MAMÃE CONTOU” (a saga de seus avós, imigrantes italianos), confesso que fico tocado pelos dissabores e embates duríssimos de tanta gente que nem conheci, mas que me doaram genes, no mínimo, o da esperança. Atentem para o passado, para a jornada árdua dos pais e dos nossos Maiores: o esforço que se faz nestes novos tempos não é, afinal, tão heroico e brutal, como você pode estar imaginando, sem qualquer intento de menoscabá-lo. E, para evoluir, humildade e sabedoria sempre. Sim, a vida ficou emulativa e complexa, mas o mundo já foi bem mais estreito e difícil. Hoje, qualquer piá de merda acha que pode deitar cátedra, reclamar com insolência, assumir postos de comando e reger a vida de seus eventuais subordinados, com pose de autoridade, quando, sinceramente, mereceriam, às vezes, umas boas chineladas no bumbum. Pode ser um chefete de ocasião, um ilustre doutorzinho, professor endeusado, gestor público estabanado, colega ou vizinho espaçoso, insensível e egocêntrico ou qualquer destaque midiático; pode ser não importa quem: o futuro irá devorá-lo. Inexoravelmente e sem piedade. Cabeça existe para pensar e História é fonte de inspiração.