Homenagem

Da Série: PARÔNIMOS NOSSOS DE CADA DIA

(Não quero esmolas, apenas uns trocadilhos)

Homenagem

Era um belo de um Puro-Sangue; vencedor imbatível nas corridas do Jokey Club de Turmalina. O local bem que poderia se chamar J.C. da Turma Linda. Eram tantas e tantas beldades, desfilando seus indefectíveis chapéus importados de abas longas e ornamentos brilhantes. Ternos de risca de giz e sapatos de bico fino para os homens e acromegálicos saltos para as damas; aliás, estas, vestidas sublimemente com delicados vestidos de tons pastéis e pérola, compunham um quadro de exacerbada elegância. Quanto a isso, não me iludia. Como poderia? Todos estiveram ali para contemplar, para reverenciar as estrelas quadrúpedes, especialmente meu Puro-Sangue, com cuja menção inaugurei esta narrativa. O seu nome, considerando o desempenho invicto e o histórico de colecionador de recordes, não poderia ser mais apropriado: Bolt.

Fui muito feliz e principalmente próspero com saudoso Bolt. Nos páreos amealhei verdadeiras fortunas com o exemplar do equídeo exemplar. Sua procedência? Um corcel vindo especialmente do Marrocos, adquirido às custas de insana economia obtida por meio dos ganhos do trabalho árduo e incessante na minha fazenda de porte médio, mais adiante descrita.

Mas eu disse, saudoso? Sim de fato; após anos e anos de serviços exitosamente prestados, aposentei-o e o desobriguei de qualquer atividade laboral. Pelo tanto que me dera, mereceria um epílogo de vida sereno, sedentário. Esse foi o meu erro; não pela concepção, mas pela condução do processo. Bolt não suportou “vestir pijama”, deprimiu-se com a inatividade imposta; adoeceu, definhou e foi correr em raias celestiais. Nunca soube explicar, ao certo, o que acontecera; os veterinários bem que poderiam ter elaborado teses mirabolantes para, pelo menos, aliviar-me do remorso.

Diante do quadro de desolação, juntei os cacos da saudade e engendrei uma homenagem para meu eterno campeão.

Antes, porém, tive altercações com a vigilância sanitária animal do Ministério da Agricultura. Na minha ignorância institucional, achava que era responsabilidade do Ministério da Fazenda; Só mais tarde um desses fiscais, constrangido, me explicou que o termo “Fazenda” não era referente à propriedade rural e sim a “Finanças”. Isso agora não importa tanto; o fato mesmo é que eles não queriam de forma alguma autorizar o enterro do Bolt; diziam que a norma vigente determinava a cremação de toda e qualquer espécie animal, como medida imprescindível de saúde pública.

— Mas ele não é um simples animal, ele é o Bolt, argumentava, mostrando as medalhas ganhas e os troféus que superlotavam a minha sala de estar. Era inócuo.

Como alternativa, chegaram a sugerir que eu o empalhasse. Achei a ideia interessante, mas pela mais absoluta falta de taxidermista por aquelas bandas, tive que dissuadir-me.

O dilema foi equacionado com alguns porcos, umas galinhas, uma novilha, umas sacas de feijão, ervilha e outras “verdinhas”. Fizeram ouvidos e “olhos” moucos e foram embora. Nada como o bom senso na negociação, não é mesmo?

Obstáculo superado, deixe-me pagar dívida de linhas passadas e falar um pouco da fazenda. Chamava-se até antes da chegada do homenageado, Fazenda Passo Lento, uma alusão à vida bucólica e tranquila que imaginava levar. Após a chegada do Bolt, mudei o nome para Fazenda Galope Veloz.

A propriedade de porte médio, era circundada por pinheiros e árvores frutíferas. Alguns hectares eram destinados ao plantio do feijão, milho, ervilha, mandioca e soja. Criava moderadamente porcos, galinhas, ovelhas, vacas e cabras, além de equinos.

A sede era uma construção de alvenaria com a varanda sustentada por quatro colunas de madeira-de-lei e um arco na entrada. O meu xodó era mesmo o haras, por motivo tão óbvio que desnecessário fazia alongar-me nele. Demais detalhes arquitetônicos e decorativos furto-me falar. Desejo mesmo prestar loas ao amigo ausente.

( ).

O seu enterro foi reservado a algumas pessoas: além de dona Magnólia (esposa), Etelvina (cozinheira), Jacinto (veterinário e cuidador), e as crianças, convidei uns poucos compadres, amigos do jóquei e o jornalista Rubião Cavalo (era mesmo o seu sobrenome, malgrado sua área de atuação e seu porte físico justificassem também o uso da palavra).

Foi uma cerimônia emocionante, pelo menos para mim. A imprensa escrita cobriu com competência o fúnebre evento.

A cereja do bolo, contudo, estava por vir: Ao descerrar a placa fincada sobre o terreno mortuário, podia-se ler: “Aqui jaz mais que um ser vivo. Um amigo de valor inestimável. Um verdadeiro campeão. Um transformador da minha vida e da minha família em todos os aspectos. Não é homem, nem mulher; criança ou idoso. Para saber quem repousa sob os sete palmos deste terreno, não é difícil descobrir: é só cavá-lo”.

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© Leonardo do Eirado Silva Gonçalves

Setembro/2017

Leonardo do Eirado
Enviado por Leonardo do Eirado em 04/06/2018
Reeditado em 25/06/2018
Código do texto: T6354919
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