MÃO NAS COSTAS - Raul Franco
Sabe aquele dia em que você passou a mão nas minhas costas e, de repente, me veio uma lembrança da infância? Eu pedi pra que você continuasse, porque a lembrança era boa. As suas mãos percorrendo as minhas costas pareciam com as da minha mãe. Talvez, por causa disso, tenha vindo a lembrança. Nunca pensei que fosse tão bom as mãos deslizando pelas costas. Tem razão, como você mesma diz, o corpo não tem memória, ele é memória - memória da pele, como aquela canção antiga que a gente escutava e sorria.
A sua mão deslizando e o meu pensamento: um dia, na escola, uma árvore foi derrubada. Não sei se propositadamente ou casualmente. O que sei é que ela caiu sobre os brinquedos. Era uma árvore enorme. O carrossel, o balanço, tudo ficou embaixo da árvore. E o nosso brinquedo já era a árvore no chão. E também uma possibilidade de esconderijo.
Sempre gostei de me esconder, como qualquer criança peralta. No meio do verde, eu era como um bicho, correndo feliz. Escalava troncos e catava aquele bichinho preto, aquele inseto que chamávamos de soldadinho. Acho que porque ele parecia um capacete preto de bolinhas brancas. Nunca mais vi esse inseto. Nunca mais me escondi nas árvores. Aliás, árvore pra mim sempre representou o mágico, o lúdico. Sempre gostei de subir nelas. Na esquina de uma vila onde morei também havia uma árvore pequena. E eu, várias vezes, a escalava. E catava os soldadinhos que ficavam presos entre o indicador e o polegar. Eu voltava pra casa correndo, o vento na cara, o soldadinho na mão...
Ainda sinto as suas mãos nas costas... lembro da infância: lugar para onde fica difícil a volta. Mas, mesmo de barba na cara, desencadeei esses pensamentos por causa de uma sensação tão boa de sentir.
As suas mãos, as mãos de minha mãe, a saudade... O TEMPO.