A FELICIDADE MORA AO LADO

Tenho uma foto de festejo e confraternização na casa de meus pais, em Xangri-lá, que hoje nem mais existe. A casa era grande, simples, com dois terrenos, muitas árvores e arbustos, que vingaram no solo arenoso por obstinação de meu pai. Mais de vinte pessoas nela pousaram ao mesmo tempo. Não havia, obviamente, ar-condicionado ou ventiladores de teto, o mobiliário era bem comum e singelo, móveis que sobravam de mudanças em Porto Alegre. Minha mãe costumava passar os dois meses de verão por lá, com a filha Ana Maria e Ieda - o braço forte e cozinheira para muitos talheres. Os filhos que estivessem em férias, o pai, netos, vários outros parentes e amigos povoavam os finais de semana ou ficavam temporadas. Aliás, nos primeiros tempos, ali veraneavam os avós José Simões e Dina, tios Cícero, Isabel e filhos, Ieda sempre, pai, mãe e todos os filhos. Depois, pouco a pouco, as famílias foram se espraiando, no compasso do crescimento. Eu próprio adquiri casa, no verão de 1984. Lá estabelecidos ou não – mesmo baseados em outras praias -, os eventos quase sempre aconteciam naquele recanto de fantasia, durante o dia ou à noite, do Natal, Ano Novo ao Carnaval, sem falar em Aniversários e churrascos seguidos, nas rodas de carteado noite afora e nas comilanças preparadas pela cozinheira - secundada por empregada de origem local - que colocava as imensas panelas na mesa para o competente combate entre comensais e geral desfrute. Ieda era o esteio operário e amigo, meu pai, o desbravador, jardineiro e o amparo material, e minha mãe Maria, coordenadora de tudo e o espírito, a alma da casa, com Ana Maria de fiel escudeira. Tios Cícero e Isabel já veraneavam então em Atlântida. Hoje, o veraneio é comparativamente sofisticado ou, digamos, bem mais confortável: casas com piscina, ar-condicionado, bons móveis e vários eletrônicos. É um outro conceito de "veraneio", com net, internet e tele-entregas. Quase uma vida urbana ordinária. É claro que, tendo chegado a esta nova era, não abriria mão das comodidades possíveis. Ninguém é tão retrógrado, saudosista e radical. Mas, pensem bem, nada supera a felicidade, o bem-estar, a alegria e o clima caloroso daqueles dias, a despeito de todos os contratempos. Era bom, depois da sesta, ao cair da tarde, visitar e tomar um chimarrão novinho e cheiroso, à sombra e ao frescor das árvores, que a mãe preparava para quem viesse, às vezes até com um restinho de bolo, que raramente sobrevivia a tantos apetites saciados. Quem sabe um naco de melancia gelada? É, a felicidade morava ao lado.