LEITORES, EU VI... E VOU LHES CONTAR
Madrid já era nossa conhecida de alguns anos. Revê-la foi um prazer renovado. Na capital espanhola, ficamos hospedados no Ilunion Hotels, excelente e moderno empreendimento hoteleiro.
Ao iniciar a descrição dos lugares visitados em meus périplos turísticos, descrevo parte da história da localidade. Também me debruço, embora timidamente, sobre a arte e a cultura de seu povo. Esforço-me, ainda, em relatar eventos envolvendo personagens marcantes das épocas referidas no texto. Assim como faço agora:
Na antiguidade, a existência física de Madrid foi tida como acontecimento mitológico. Segundo certas teorias, ela teria sido fundada por Ocho, rei romano, filho de uma deusa, um mito do povo. A cidade também já foi chamada de Ursa, nome que teria sido originado em face da existência desse animal nas montanhas madrilenhas.
A cidade foi fundada por Mohamad I, filho do emir de Córdoba, Abderramão II, nascido no ano 852 e falecido em 886. A denominação Madrid deriva da palavra árabe “Macher-it”, cuja tradução significa “mãe de água abundante”. Depois de diversas corruptelas, tais como Magerit e Madrit, chegou-se, finalmente, à denominação hoje conhecida.
Mohamad I construiu uma fortaleza destinada a defender Toledo das ações beligerantes dos cristãos leoneses e castelhanos. Esse palácio fortificado situava-se no local onde se exibem, imponentes, o Palácio Real, a Praça do Oriente e a Catedral.
A região esteve sob domínio árabe até 1085, quando Alfonso VI reconquistou Toledo. Em 1202, Afonso VIII concedeu a Madrid o título de vila.
A Espanha também viveu sob a tutela austríaca, comandada pelo imperador Carlos I de Espanha e V da Alemanha (1516-1555). Em 1534, ele concedeu a Madrid a coroa de seu brasão, ao tempo em que realizou importantes reformas no palácio imperial. Seu filho e sucessor, Filipe II (1556-1598), transferiu para Madrid a corte estabelecida em Toledo, então capital do reino.
Isabel, a Católica, depois de suceder ao irmão, Henrique IV, deu início a obras urbanísticas na cidade, que se desenvolvia com o passar dos anos. No reinado de Filipe III (1598-1621) também foram realizados inúmeros desses empreendimentos.
O rei Carlos III (1759-1788) realizou expressivos projetos urbanos, destacando-se a rede de esgotos e a iluminação pública com lâmpadas a óleo. Em uma das extremidades do Passeio do Prado foi erguida a Porta de Alcalá, em 1778, e, em 1785, edificou-se um museu neoclássico, isto é, uma instituição destinada a buscar, conservar e estudar objetos de valor artístico. No caso, um ambiente para abrigar a coleção de história natural. Em 1819, esse templo da cultura foi transformado no que, hoje, se conhece como Museu do Prado.
No reinado de Carlos IV, em 1790, foi reconstruída a Plaza Mayor ou Praça Maior, depois de devastada por um incêndio. Mais adiante, farei comentários atinentes a esse ambiente de grandes proporções físicas, que abriga múltiplas atividades econômicas e recreativas.
Os Palácios de Miraflores, de Líria e tantos outros edifícios destinados às residências da nobreza da época foram edificados no século XVIII.
A guerra civil espanhola aconteceu no período de 1936 a 1939. Antes do sangrento conflito, existia ferrenha animosidade entre partidários do general Francisco Franco, denominados Falangistas, e os componentes da Frente Popular.
Os Falangistas combatiam as ações comunistas que assolavam a Espanha, apoiados por setores tradicionais e conservadores da sociedade civil, tais como Exército, Igreja Católica, proprietários rurais, e até por ações militares patrocinadas pela Alemanha nazista e a Itália fascista.
A Frente Popular, por seu turno, doutrinada pela filosofia comunista, era apoiada por sindicatos e partidos políticos de esquerda, sob alegado pretexto democrático. Defendia o governo, contando com a ajuda da então União Soviética.
Em 18 de julho de 1930, com o ânimo político e social bastante exacerbado, ocorreu o golpe de estado contra o Governo da Segunda República Espanhola (1931-1936). O golpe, patrocinado pelo general Francisco Franco, resultou dividindo a Espanha entre duas facções: a Falangista e a Republicana, que guerrearam entre si, provocando a morte de quatrocentas mil pessoas, envolvidas direta ou indiretamente no conflito.
As ações bélicas ocorridas durante os três anos de guerra civil fizeram inúmeros estragos. O principal deles, a animosidade fratricida, com execuções patrocinadas por ambos os lados. A destruição de prédios, igrejas, casas e outros bens materiais, decorrente da insanidade bélica que contou com os auspícios da Alemanha Nazista, da Itália Fascista e dos russos não foram de pouca monta. Pelo contrário. Custou muito à nação espanhola.
O general Francisco Franco faleceu no dia 20 de novembro de 1975. Com a morte do militar, assumiu o trono espanhol o rei João Carlos I. A partir daí, deixando para trás os infortúnios da guerra fratricida, a Espanha retomou o caminho do crescimento econômico e da justiça social.
Nos dias passados em Madrid, andamos que só burra-de-padre. Não medimos esforços para visitar alguns dos mais importantes logradouros públicos da cidade, seus monumentos históricos e obras de renomados artistas, em cujas veias correm o sangue espanhol. Se azul, não sei. O meu é vermelho!
Aqui, faço um parêntese, para dizer algo sobre o significado da expressão “burra-de-padre”, referida no parágrafo anterior. No Nordeste brasileiro, o dito refere-se à pessoa que anda por muitas léguas, cansado e exausto. Também é relativo à lenda regional sobre uma mulher adúltera, amante de certo padre paroquiano, infringente dos votos de castidade. A maldição fizera a pobre alma libidinosa vagar pelas noites escuras das quintas-feiras, travestida de burra, à procura de alguém ou de algo que lhe permitisse a quebra do encantamento maligno. Ao padre não foi aplicado o feitiço. Por quê?
Desculpe-me, leitor. Distanciei-me do propósito de contar-lhe a respeito de minhas recentes andanças pelo Velho Mundo. Não resisti ao fascínio de trazer a lume o significado da expressão “burra-de-padre”. Volto, portanto, ao assunto precípuo deste texto:
Fizemos citi tour pela moderna Madrid, em ônibus de empresa de turismo e em táxis metropolitanos. Também realizamos passeios a pé. Em todas as oportunidades, revimos e vimos logradouros, monumentos e edifícios antigos e contemporâneos, alguns pela primeira vez.
Em diferentes ocasiões, passeamos pela Grã Via, uma das artérias mais concorridas de Madrid. Andamos por seus calçadões apinhados de gente, efetuamos compras em lojas da localidade, frequentamos cafés e restaurantes, e fotografamos à larga.
Também visitamos a Praça de Espanha, uma área urbana ajardinada, composta de vários edifícios, entre os quais, a Torre de Madrid e o Edifício Espanha, além do monumento em homenagem a ilustre espanhol Miguel de Cervantes Saavedra, nascido em Alcalá de Henares, no dia 29 de setembro de 1547 e falecido em 22 de abril de 1616. Cervantes era romancista, dramaturgo e poeta, autor da obra-prima Dom Quixote de La Mancha.
Estendemos nossas andanças por conhecidos lugares, entre
os quais a Porta do Sol e a Porta de Alcalá, esta, um dos monumentos mais famosos de Madrid. Inspirada no Arco do Triunfo, em Paris, foi erguida a mando do rei Carlos III, em 1778.
Também elegemos a Porta do Sol como o lugar de imperdível visita. Lá, foram realizados importantes acontecimentos históricos, tais como: a rebelião ocorrida em 2 de maio de 1808. Nesse ano, as tropas de Napoleão Bonaparte invadiram Portugal, fazendo a família real portuguesa fugir para o Brasil. A Espanha era aliada dos franceses que a traíram. Do entrevero, foram envolvidos no conflito, além de Portugal, a Espanha, Grã-Bretanha e França. A crueldade do conflito foi expressada em tela do espanhol José de Goya Y Lucientes, conhecido por Francisco de Goya, renomado pintor de sua época, nascido em 30 de março de 1746.
Destaco entre os lugares visitados, a Plaza del Toros, conhecida como Praça Monumental das Ventas, local de memoráveis touradas, divertimento do povo madrilenho desde a época medieval. No século XVII, era comum a realização de touradas na Plaza Mayor, até que, em 1754, o rei Fernando VI mandou construir uma arena com capacidade para doze mil espectadores.
Com o crescimento da população e as constantes excursões de turistas sequiosos por conhecer as tradicionais touradas madrilenhas, o espaço tornou-se modesto para abrigar tanta gente. Em face disso, foi construída, já no século XX, a Praça Monumental de Ventas, com capacidade para 22.000 pessoas. Essa, que visitamos pela terceira vez, sem, contudo, assistirmos a nenhum espetáculo do gênero, não por desinteresse, mas, sim, de oportunidade, pois, nem sempre as touradas coincidiram com os dias de nossa estada em Madrid.
Estivemos em visita a Plaza Mayor, localizada no centro da cidade, pertinho da Porta do Sol e da Praça da Vila. A Praça Maior data do século XVI, com sua construção iniciada em 1617 e concluída em 1619, a mando do rei D. Filipe III, primeiro monarca da Casa de Áustria, nascido na Espanha. A obra de 129 metros de comprimento por 94 de largura substituiu outro logradouro preexistente, denominado Praça do Arrabalde, onde, então, funcionava o mercado principal da vila.
A Praça Maior constituiu-se, à época, empreendimento de vanguarda. Suas 136 habitações, compostas de 437 balcões ou sacadas, erguidos em toda a extensão dos cinco pavimentos, permitiam a cinquenta mil pessoas contemplarem os movimentos festivos, as touradas, torneios, casamentos da realeza e até execuções físicas dos inimigos da Corte. Ali, também, aconteceram as cerimônias de beatificação de Santo Isidro e Santa Tereza de Jesus.
Três grandes incêndios fizeram parte da história da Praça Maior, o primeiro, em 1631, o segundo, em 1670 e o terceiro, em 1790. Por ocasião da última reconstrução, o arquiteto Tomás Román reduziu o número de andares do imenso edifício para três pisos, como se vê hoje em dia.
O monumento equestre em honra ao rei Filipe III sobressai-se no centro da Praça Maior, concitando os turistas a registrarem suas presenças mediante repetidas ações fotográficas. A estátua de Filipe III é obra Pietro Tacca e foi esculpida em 1616, para ser exposta na Casa de Campo. Foi trasladada para Praça Maior em 1847.
Com esta, já escrevi seis páginas, contando, não o tudo, mas, pequena parcela do que considerei importante transmitir ao leitor. Aqui, faço uma pequena parada para descanso. Não que me sinta cansado em escrever, uma mania herdada não saberei dizer de quem, pois meu genitor, homem de reduzidas letras, porém bem afeiçoado à leitura, faleceu aos vinte e nove anos, deixando-me com apenas seis, sem tempo de me conduzir pelos caminhos da literatura, que insisto em exercê-la, às vezes, tropeçando na gramática, maculando a arte literária que exige digno respeito. Mas, o que fazer se gosto de escrever e disponho de benevolentes leitores?
Até a próxima vez! Ainda lhe falarei de Madrid.