O Rabo do Diabo
      Mais um menino nasceu, bem pequenino adoeceu, quase morreu.
Vingou, entre primos e irmãos se criou.
      A mãe lia o que via, mas não compreendia. Só dizia: para  que  tanta braveza!
Estudava, mas quando podia, fugia.
Gostava mesmo era de quebrar as bicicletas da gurizada, tirava as peças em bom estado.
      A bicicleta dele  tinia, cantava. Sempre novinha,  pintada.
Às vezes também gostava de roubar ovos e aquela penosa. Entregava para a mãe e dizia:
Da granja. De que granja? Não sabia, ou fingia que não via.
Arrumou um emprego para fingir que trabalhava, e continuava a fingir que estudava.
      Até namorava para enganar a alma homossexual que carregava.
Mudou a diversão, cansou   de furar bolas, de quebrar bicicletas, de roubar.
     Agora se divertia em grupo.
Andava enturmado com garotos que saiam à noite para fazer arruaça.
A maior diversão era espancar homossexuais de graça.
E batia, batia para esconder o que na alma lhe ia.
Namorava, até ficava com minas marotas capazes de o  excitar,  mas o que queria
mesmo  era se mostrar garanhão de causar inveja, o maior tesão.
       Casar não. Ou melhor, só casaria se algum dia cruzasse com uma moça maluquinha, bobinha.
Aconteceu!...
Quanto sofreu! Dor para além da dor. Medo, terror.
Só não morreu porque era sangue forte lá do Norte.
Quando pode fugiu.
Fugia tanto que nunca se viu.
Sem braços para trabalhar, sem uma alma para maltratar, começou a definhar.
Ainda havia um cão em quem batia sem dó.
O cão morreu, ficou só.
Aquela casa limpinha aquele fogão a brilhar, as panelas e tudo mais começou a enferrujar.14
Sujeira por todo o lado, teto rachado, paredes a descascar.
   De tanto querer ser ao diabo igualzinho, já lhe anda a nascer um rabinho.
 
                               Lita Moniz