Oi!
- Claro que já nos conhecemos.
Até fugi dos seus sapatos querendo sujar meu vestido.
-Seu gato atrevido! Como se atreve a falar comigo?
-Não sou gato, sou gata.
Se a sua mulher souber o que eu sei o mata.
Sou sua vizinha.
De vez em quando faço uma visita à sua cozinha.
- Tem mais uma coisinha que lhe quero dizer:
Você não acha que já passou da idade de brincar de
esconder aquelas revistas que anda a ler?
- É brincadeira.
Só essa me faltava: sou vizinho de uma gata bisbilhoteira.
E faladeira...
- Não fique zangado, não vou contar para ninguém o seu pecado.
- O que quer de mim afinal?
- Ser sua amiga.
De vez em quando quero também um pedaço de queijo e um beijo.
- Ah, essa é demais!
- E quero mais:
Sou uma gata intelectual.
Vai ler alto para mim. Não notícias do Jornal, essas ouço todo o dia
na televisão.
Coisas tão sem graça, só desgraça!
Quero que leia para mim coisas assim que deixem o mundo menos ruim.
Vamos marcar encontros no seu jardim.
Eu finjo que durmo e você lê para mim.
- Por que você acha que eu vou aceitar?
- Porque sei que vai gostar .
  É observador, um bom leitor.
- Deixa de bravata, você é só uma gata.
- Gata intelectual, ando a estudar para decifrar a sua escrita. Sou cientista.
- Não acredito no que estou ouvindo. Só rindo!
- Por favor, não comece por Sócrates, Platão, suas histórias estão mais para memórias.
- Vamos pular Sartre, ninguém mais acredita no seu ditado, foi bom, mas são coisas do passado. 
- vamos Começar pelo Mundo Líquido de Zygmunt Bauman é mais atual,realista.
  Não vá pensando que por ser gata ainda penso como pensava uma normalista.
  Enquanto lê para mim e para si, vai aprender a ler o que neste mundo se anda a  fazer   
  Vai perceber que a lista de desejos mudou.
  Que o seu mundo também acabou.
   Passou!
                                                     Lita Moniz