O MONSTRO

A vida da minha irmã Ana é bastante centrada na Rede Globo, notadamente em novelas, onde é comum projetar-se nas personagens e suas tramas. Ao longo de todos estes anos, foi construindo paixões, simpatias e desencantos, tal como qualquer um de nós no mundo real ou, mesmo, imaginário. Realidade e fantasia não se distinguem muito bem, seguidamente. Há anos, é fiel a uma paixão por veterano galã da telinha, Tony Ramos, que até parece ser boa gente. É quase uma relação virtual estável. Em outros tempos, lá pelos seus vinte e poucos, um outro personagem exuberante roubava-lhe o coração. Esse artista - falecido em 2015, aos setenta e cinco anos - luzia, então, na telinha e era “o cara”. Certa feita, veio apresentar-se na Capital, creio que numa peça encenada no Teatro São Pedro. Minha mãe, na expectativa de satisfazer a filha, comprou ingressos e lá se foram, bem arrumadas, assistir ao espetáculo, quem sabe até conquistar um autógrafo ou, suprema glória, palavras de simpatia, após o cerramento das cortinas. Terminada, então, a apresentação, já nos camarins, a Mãe deu um jeito e conseguiu abordar o galã, explicando-lhe rapidamente a situação e solicitando um minutinho de seu tempo. Pois o célebre indivíduo, esplendoroso em sua vaidade estelar, ao ser apresentado à Ana Maria, não se dignou a prestar-lhe a mínima atenção, tratando-a com olímpico desdém. Rejeitada, não só nunca mais assistiu a nenhuma cena de tevê em que a figura dava o ar de sua graça senil, como não pronunciava seu nome: passou a chamá-lo simplesmente de “O Monstro”. Não vou dar nome ao boi, por que já bateu as botas