VIAGEM À COLÔMBIA V

As horas foram generosas. Apesar dos instantes dedicados à visitação dos museus Botero e Casa da Moeda, conseguimos chegar a tempo de conhecer a Quinta de Bolívar, localidade declarada monumento nacional, em 1975. O lugar passou por vários proprietários, entre eles, a Ermita de Monserrate, seguida de Don Antonio Portocarrero Y Salazar e seus herdeiros.

Em 1813, construída havia três anos, abrigou o Vice-rei Antonio Amar y Borbón. Ali, foi celebrado o aniversário da esposa do Vice-rei, cujo nome, com o perdão dos leitores, omito por absoluta ignorância.

Por último, dona Rosa de Castillo, sogra e herdeira de dona Tadea Portocarrero, vendeu a casa ao governador do estado, Don Tiburcio Echavarría, que a presenteou a Simón Bolívar, em agradecimento pela libertação do povo colombiano do domínio espanhol. Bolívar morou naquela casa por dez anos, onde recebia ilustres figuras do cenário político. Em 1850, ao deixar a Quinta, presenteou-a a José Ignacio París.

Percorremos todos os cantos da casa em que viveu Bolívar. Varandas circundantes, jardins, esculturas, salas de estar e de jantar, quarto de dormir... Tudo. Vimos, nesses aposentos, a espada com a qual o libertador impôs sua vontade e condições aos inimigos, e até o pinico em que fazia as necessidades fisiológicas. Turista não dispensa nada que se lhe possa ser mostrado. Acha tudo interessante! E um pinico, então...

A Quinta de Bolívar, depois do falecimento do libertador colombiano foi adquirida pela Academia Colombiana de História que, ali, instalou o Museu Bolivariano. Este, que conhecemos e sobre o qual lhe contei pequena parcela de sua história.

Transcrevo carta enviada por Simón Bolívar ao general Francisco de Paula Santander, pedindo-lhe para retornar à Quinta, onde morara, pois se encontrava enfermo:

"Mande-me você compor a Quinta, que é onde vou viver enfermo, como você mesmo indicou com muita razão... Também me fará o favor de mandar-me comprar pratos e copos, pois preciso para comer na Quinta com poucos amigos, porque vou viver muito sobriamente na qualidade de enfermo..."

No dia 6 de janeiro, encerramos nossa estada em Bogotá. Fechamos a conta do hotel e nos dirigimos ao aeroporto local. Em aeronave da Avianca, embarcamos com destino a Cartagena. O voo durou pouco mais de uma hora. O Aeroporto Internacional Rafael Nuñez, em Cartagena, foi inaugurado em 14 de fevereiro de 1920.

Durante o percurso, o comandante chamou-me a atenção pelo serviço de comunicação de bordo para parabenizar-me pelo meu aniversário, ocorrido naquela data. Os passageiros aplaudiram-me pelo transcurso dos meus setenta e seis anos de vida. Esta foi a segunda vez em que recebi homenagens pelo meu natalício.

Cartagena de Indias não deve ser confundida com sua congênere espanhola. Essa é uma cidade fundada pelos fenícios em 227 a.C. e pertence à província de Múrcia, na Espanha. A que visitamos foi fundada por Pedro de Heredia, em 1533.

Trata-se de uma cidade que encanta o turista por suas muralhas, ruas e antigas edificações com plataformas salientes nas fachadas, conhecidas por balcões ou sacadas. A parte moderna de Cartagena abriga grandes hotéis, cassinos e ativo comércio de variada especialidade.

Ainda hoje, a cidade fascina o visitante ao sabê-la cobiçada, em épocas pretéritas, por piratas ávidos da riqueza explorada na América conquistada pela Espanha.

Nos séculos dezessete e dezoito foram edificados onze quilômetros de muralhas e fortes para protegê-la de ataques dos aventureiros dos mares, conhecidos por piratas do Caribe, saqueadores do ouro e demais riquezas da colônia espanhola.

As muralhas e edificações ali existentes convivem harmoniosamente com prédios modernos, apontados para o alto, desafiando o firmamento. A Cartagena atual é agradável e convidativa para momentos recreativos.

E o que dizer da Cartagena cultural? São vários os eventos realizados durante o ano e que fazem a alegria de citadinos e turistas. Vejamos os principais: Festa dos Toureiros da Colômbia, realizada nos dias 2 a 6 de janeiro; torneios de voleibol e futebol, nos meses de janeiro, junho e dezembro, com participação de profissionais da América Latina, Estados Unidos e Canadá; Festival Internacional de Cinema e Televisão, em março; Festival do Doce, em abril; Festival de Verão, em junho e julho; Festival de Jazz e, finalmente, as festividades de 11 de Novembro, comemorativas à independência do país.

Um dos motivos de nossa visita a Cartagena foi o de participar do Festival Internacional de Música, realizado nos dias 6 a 16 de janeiro de 2017. Esta foi a décima primeira edição do consagrado evento cultural que, neste ano, recebeu o título de Símbolo y Sonido: Paris y la Música Francesa de Princípios de 1900.

Nas palavras de Rodolfo Segovia, “na Belle Époque chegaram da França a moda, a literatura, a arquitetura e, claro, a música”. A última expressão justifica a honraria concedida na forma de titulo ao famoso evento, referência artística e cultural de âmbito internacional.

O badalado festival contou com a participação de destacados artistas franceses e de outras nacionalidades, inclusive do Brasil. Registro, aqui, alguns desses ilustres nomes: Jean-Efflam Bavouzet, pianista; François Xavier Roth, diretor; Jenny Daviet, soprano; Alphonse Cemin, pianista; Juliette Hurel, flautista; Emmanuel Ceysson, arpista; Bertrand Chamayou, pianista; Sarah Dayan e Cécile Roubin, violinistas; e dezenas de outros interpretes, além dos brasileiros Renato Borghetti, Daniel Sá e Pedro Figueiredo. Outros nomes importantes poderiam ser mencionados, mas, fico por aqui.

Os citados artistas reviveram nomes de imortais autores, dos quais registro: Claude Debussy, Jean-Philippe Rameau, Maurice Ravel, Oscar Straus, Georges Bizet, Johannes Brahms, Franz Schubert, Heitor Villa-Lobos, Astor Piazzolla, Carlos Gardel... E tantos outros.

Foram realizados concertos pela Orquestra Sinfônica de Cartagena, além de shows musicais em teatros, salas de espetáculos e ao ar livre, estes últimos, oferecidos ao público, gratuitamente, pela edilidade local.

Como disse a ministra da Cultura da Colômbia, Mariana Garcés Córdoba, “a música não é só uma das mais altas expressões da humanidade; é, também, um veículo de transformação social. Gera entre as comunidades o fortalecimento do tecido social e propicia a convivência pacífica”.

Participamos de alguns eventos. Diversos de nossos amigos abusaram, no bom sentido, da extensa oferta de espetáculos, cujos preços exorbitaram do poder aquisitivo ou da decisão de gastar de outros, menos afortunados.

Por oito dias, ficamos hospedados no Hotel Caribe, localizado no bairro Boca Grande, situado entre o Mar do Caribe e Baia de Cartagena. Boca Grande é um setor de praias bem edificado da cidade, com grandes e imponentes edifícios. O mar, nos meses de dezembro a fevereiro torna-se bastante agitado, inundando com suas ondas bravias as calçadas marginais da praia.

As dependências do Hotel Caribe são gigantescas, intercaladas de arquitetura clássica e contemporânea. Trata-se de ambiente classificado com cinco estrelas pelas autoridades turísticas. Um bom e confortável empreendimento de apoio aos visitantes, dispondo de enorme piscina, jardins espaçosos frequentados por aves e alguns animais silvestres, grande restaurante e até praia particular.

Almoçamos ali mesmo, no dia 7 de janeiro de 2017. Alguns de nós fizemos nossos pedidos pelo atendimento a La Carte, enquanto outros optaram pelo sistema self service. Finda a refeição, nos recolhemos aos apartamentos para breve descanso.

À noite, jantamos no Restaurante Quebracho, localizado na parte antiga da cidade, cercada por altos muros, como já mencionei anteriormente, erguidos para proteção contra invasores e piratas de épocas distantes.

O Restaurante Quebracho é bastante concorrido. O atendimento somente é feito com reserva prévia. Naquela noite, por deferência a nós brasileiros, nos foi permitido aguardar mesas para darmos início ao nosso jantar, aliás, comemorativo ao meu aniversário natalício. Era a terceira vez que eu recebia homenagens pelo transcurso dos meus 76 anos. Não se comemora essa idade tão facilmente. Deus, em Sua infinita bondade, concedeu-me o privilégio de festejá-lo mais uma vez, desta feita na companhia da plêiade de amigos com que me fiz acompanhar. E de minha querida esposa, santa mulher que me atura por mais de meio século. Cinquenta e três anos, para ser exato.

Foi uma noite festiva e agradável. No Quebracho, bom conjunto cubano tocou e cantou músicas caribenhas. Em certos momentos, interpretaram, repetidamente, para mim e outros aniversariantes, a melodia Parabéns Pra Você, entoada com entusiasmo enquanto éramos aplaudidos retumbantemente.

Saímos dali, satisfeitos e sonolentos, pois, os ponteiros dos relógios anunciavam o início de um novo dia: 7 de janeiro de 2017. Ao confirmar a data, caí na real, ao constatar que já envelhecera um pouco mais. Minha idade agora somava 27.741 dias ou 665.760 horas.

De hoje a dois dias, voltarei a importuná-los. Agora, descansem. Hasta luego!