MOEDA E CARÁTER

Sou do tempo do cruzeiro, aquele "velho" cruzeiro – moeda oficial – que surgiu em 1942, em substituição ao réis, vigente desde o Brasil Colônia: em 1° de novembro de 1942, mil réis passaram a valer um cruzeiro. Das nove moedas que já possuiu o Brasil, tive de me virar com oito. Quero lembrar com saudade dos tempos anteriores à construção de Brasília, de 1960 (inflação), especialmente antes das crises do petróleo, notadamente dos anos 70. Não havia tantas novidades, conquistas ou desfrutes tecnológicos; com uma notinha de um cruzeiro eu comprava 20 caramelos na bodega da esquina da nossa rua interiorana, ano após ano. Tempo de calças curtas com suspensórios, banhos de rio, sorvete artesanal de qualidade, grapete, crush, laranjinha, soda limonada e meninas lindas de meias brancas soquetes. Tempos de missa aos domingos e festas em salão paroquial. Bom, não quero me perder em assomos nostálgicos – embora coisa boa – mas criticar alguns aspectos da nova ética e da nova estética contemporâneas. Se a religião católica vacilou, não evoluiu, pecou demais e perdeu espaço, ficamos um tanto sem rumo e disciplina, por mais que se possa questionar a cultura dos velhos tempos. Imagina só obrigar o guri de hoje a rezar compenetradamente a cada início de aula, a confessar ou a comungar em longas missas em latim. Bah! Os professores disciplinadores de outrora seriam massacrados, hoje, pelos pais, se antes não o fossem pelos próprios alunos. Até nas Faculdades, notadamente particulares, os alunos geralmente têm razão. Resumo de leituras para vestibular? Nem pensar, meu caro: ou você lia e respondia o fundamental na bucha, ou nada feito, sem tapeação. Havia prova oral e a gente escrevia longos textos. Claro, não pululavam escritores de escol, mas os clássicos são os clássicos, insubstituíveis. Enfim, tudo muda, mas é preciso ao menos que se preserve a base econômica do país. Não se vislumbra risco iminente, ainda que sempre caiba a lembrança das nossas mudanças de feições, referências e modo de viver: as famigeradas trocas de moeda, quase de caráter. Vamos fazer um esforço para arrumar a casa, trabalhar mais, combater a corrupção, escolher melhor nossos representantes e, assim, contribuir para espantar o espectro da crise. Não quero lembrar do "gatilho salarial", da URV, da URP, da UPC, do "Over Night" e outras modalidades de índice ou de Hot Money". Na verdade, até curtia o lance financeiro - seus malabarismos instigantes - mas a população sofria demais. Para frequentar cassino, os que conheço geralmente viajam alegremente rumo a outras paragens.