PARECE GENTE!
Bete Bissoli
Cachorro também é ser humano, já disse um folclórico ex-ministro da República, anos atrás. E não é que ele quase “tinha razão”! E não é que parece que é mesmo! Pelo menos os cachorros lá de casa!
No total, agora, eles são três: dois tomba-latas puro-sangue (a mãe e o pai) e um, o mais novo rebento da família, que sabe-se lá de que raça é.
A mãe, Pitoca, é branca de manchas pretas. Elegante, miúda e magrinha, mais parece manequim. Uma graça!
O pai, Panda, também é branco de manchas pretas, igualzinho a Pitoca. É simpático, grandalhão, mas tem juízo de galinha, ou cabeça de bagre, sei lá... Dizem que dentro da cabeça do peixe bagre só tem areia. Eu acho que é o caso do Panda. Ele cresceu muito e seu comportamento beira à infantilidade. É paspalhão, desastrado, mas nem por isso deixa de ser simpático. E tem outras qualidades incríveis!
O terceiro elemento do grupo, o filhote, ainda pagão, nasceu branco com manchas beges e marrons. Tem as orelhas caídas, o que lhe dá um ar entre doce e desprotegido. É lindo e... não se parece com ninguém da família!
Voltanto ao Panda, de cada vez que a Pitoca está prenhe ele se comporta como um cavalheiro. Fica paparicando-a o tempo todo, é solícito e compreensivo.
Um mês antes de ela dar cria ele pára de se alimentar. Sim, jamais invade a bandeja de alimentos que colocamos para que ambos comam! Deixa a dama comer primeiro, fica do lado olhando, como que tomando conta dela e da bandeja. Só come se sobrar. Ou se a gente conseguir prendê-lo em outro compartimento e dar alimento especificamente para ele. Como é difícil prendê-lo, ele passa, então, a viver praticamente de brisa.
Depois que a Pitoca dá cria, o jejum dele continua. “Sabe” que ela precisa se alimentar muito bem. Afinal, vai amamentar! Às vezes, até quatro filhotes!
Quando os bichinhos já estão de bom tamanho e começam a mordê-la ao mamar, ela sai, larga-os e aí é um drama (mais um!!!) na vida do Panda. Ele fica dividido entre ela e os filhos. Geralmente acaba indo consolar os bichinhos. E ela, passada a bronca das mordidas, vai dar de mamar novamente, até que uma nova mordida os separe.
Quando os filhotes desmamam, está na hora de doá-los e daí cada um vai para uma nova casa, um novo dono (geralmente uma criança do bairro).
Você pensa que o calvário do Panda terminou? Que nada! Ele não se conforma com a separação, sente falta dos filhos (a Pitoca até que se esquece logo), chora, relembra brincadeiras (os filhotes não largavam do seu pé, digo, de sua pata), fica cabisbaixo e, pra variar, sem comer.
Entre a gestação da cachorra e a doação dos cachorrinhos ele emagrece uma barbaridade. Às vezes penso que tem vocação pra faquir!
E olhe que desta vez, então, aconteceu uma coisa inédita. O filho não era dele, tava na cara!
Será que ele não percebeu? Percebeu, sim! Mas não deu demonstração e, amoroso como é, não guardou ressentimentos. Não faz parte do seu jeito de ser. Afinal, essas coisas podem acontecer na vida de um cachorro. E ainda mais: não havia antecedentes. Panda perdoou. Foi cachorro o suficiente para perdoar o deslize. Não modificou em um milímetro seu comportamento em relação à Pitoca e à cria. Seu amor foi o mesmo. Fico me perguntando se essas coisas são da natureza ou se a natureza do Panda é que é essa.
E ele está aí. Brincalhão como sempre, um pouco mais gordo agora e pronto para passar por todo o sufoco de novo, caso a Pitoca fique prenhe.
Sem deixar de ser amável, sem deixar o bom humor de lado e dono de um coração imenso!
Parece gente! Pensando bem... Será que parece?