POLVO A GALEGA OU "TAPAS" SÓ OS DA COZINHA ESPANHOLA

Os zoólogos afirmam que o polvo é um molusco porque, entre outras características, tem a carne mole. Enganam-se. Tudo porque não devem nunca tê-lo cozido. Iriam constatar que sua carne gelatinosa adquire a textura e dureza de um pneu de caminhão.

Mas esse tormentoso problema pode ser contornado. Há toda uma técnica, mesclada com práticas de simpatia, para transformar essa carne, ordinariamente rija, em algo tenro e macio. A permitir possa se desfrutado todo o rico e raro sabor que ela encerra.

De forma que vale a pena esquecer temporariamente o desagradável aspecto desse bicho frio e gelatinoso à sua frente e dos seus não menos convidativos tentáculos recobertos com aquelas horríveis ventosas.

Pegue-o com delicadeza e encare-o de frente, sem medo, que você já viu coisas piores. Coloque-o sobre o mármore da pia e segure-o firmemente com a mão esquerda. Com a direita golpeie-o, com uma tábua de cozinha, inúmeras vezes, sem dó. Xingue-o se quiser. Nada lhe será cobrado por essa sessão de legítima terapia.

Jogue-o, em seguida num grande caldeirão com água fervente. Um minuto depois retire-o, deixando descansar e esfriar por alguns momentos. Repita por cinco vezes essa operação; e, na última deixe o bicho cozinhar até ficar macio. Porque garanto-lhe que ficará. Cerca de uma hora, ou a metade desse tempo, em panela de pressão.

Depois, deixe-o esfriar totalmente e, só então, procure limpá-lo, retirando todas as ventosas de seus tentáculos. Corte-os, então, em fatias grossas, de um a dois centímetros.

O tempero é simples: azeite de oliva, páprica doce e picante e sal grosso. Um bom vinho branco será necessário para degustá-lo. E pão, fresco e crocante.

Entretanto talvez você tenha enorme dificuldade em conseguir o ingrediente principal, qual seja, o polvo espanhol. Será fácil encontrar o chileno que é pequeno ou o nacional que é ridículo.

De forma que se você estiver doido de vontade de comer polvo à galega precisará desfazer-se de pequena parte daqueles dólares guardados para ocasiões especiais. Algo em torno de mil deles.

Explico: gastará, inicialmente, pouco mais de novecentos por uma passagem de ida e volta, classe turística a Madri. Ao chegar, vá direto à Plaza Mayor. Sente-se numa das mesas de qualquer bar. Peça pulpo a feira. Pelo prato você vai pagar cerca de vinte dólares.

Mas já que você resolveu gastar, faça o sacrifício por inteiro. Peça um vinho branco. Nacional é claro, que você está na Espanha.

E procure comer todos os “tapas” que tem direito e que ali se vendem: comece pedindo mejilhones em vinagreta, uma porção de boquerones e outra de pimientos rellenos.

Faça uma pequena pausa para tomar fôlego e então peça gambas al ajillo e também um pouco de jamón serrano. Complete com langostinos en gabardina e pinchos fritos. Sem esquecer, é claro, as tortilhas de patatas.

Coma tudo sem culpa e sem esquecer eventuais sugestões da casa. Entretanto, se depois você vier a morrer de tanto comer, não se preocupe, pois você irá direto para o céu.

Porque o inexpressivo pecado da gula, nestes tempos bicudos, será imediatamente perdoado.