TRISTE MADRUGADA
Na madrugada do dia 23 de maio de 2004 por volta das duas horas batem em minha porta, levantei e fui ver o que acontecia, e para minha infelicidade era a terrível notícia do falecimento do meu irmão caçula cujo nome era Maurício.
Nessa época eu estudava no seminário Jovens da Verdade, na cidade de Arujá em São Paulo. Aquela notícia me causara certo espanto e comoção, por que o mano era pra nós símbolo de força, vitalidade além de ser muito jovem, encontrando-se apenas com 33 anos quando foi tragado por um enfarto fulminante.
Naquele momento fui inundado por tamanha nostalgia e as lembranças da infância tornaram-se latentes em minha mente. Quando meu irmão nasceu, eu tinha 8 anos de idade. Minha mãe costurava e ficava praticamente o dia todo na companhia de sua máquina, dessa forma pode-se dizer que quem cuidara e criara O Maurício fora eu.
Recordei que quando ele estava doente, e eu saia pelo mato afora a procura de uma erva chamada tradicionalmente de “picão” para fazer chá e dar banho no meu irmão devido irritação da pele.
Um belo dia estava passando um par de roupas para logo em seguida dar banho nele, quando de repente ele distraidamente colocou a mão debaixo do ferro de passar roupas e queimou sua mão, sempre que via sua cicatriz, lembrava do acidente onde ele queimara a mão.
Ele era preguiçoso para almoçar ou jantar, sendo necessário algum malabarismo para que ele pudesse alimentar, era ai que eu encenava um aviãozinho para colocar comida em sua boca.
Dizem que quando morrem toda pessoa torna-se boa..., mas a verdade era que meu irmão, as vezes não aceitava de cara algo que a gente ordenava ele fazer, mas resmungava, resmungava, e depois acabava fazendo, sempre fora um menino obediente. (...) é bom cessarmos as lembranças, caso contrário, não terminaremos essa crônica.
Logo em seguida da notícia da sua morte, tratei de me arrumar e tão gentilmente o administrador do seminário ofereceu para levar-me ao aeroporto.
O aeroporto Internacional ficava na cidade vizinha de Guarulhos. Uma das minhas atividades no seminário era limpar a piscina. Enquanto eu limpava as piscinas, ficava observando os aviões subindo e descendo..., as vezes vinha uma indagação no meu ser perguntando quando seria que eu iria viajar de avião, tamanha foi a ironia do destino que minha primeira viagem de avião foi justamente para ir ao velório do meu mano tão querido. Estranho dizer isso, mas devido tanto tempo que fora criado perto dele, a sensação era como se tivesse perdido um filho e não um irmão.
8 horas da manhã o avião decolava... e creio que como todo iniciante, a sensação era de medo, insegurança, só Deus sabe quantas vezes orava para que aquele avião não caísse, durante uma hora de viagem, me transformei no homem mais fervoroso que poderia ter na face da terra. Mas mesmo diante de tamanha preocupação com o voo, pude observar as nuvens como verdadeiros flocos de algodão, o sol batendo sobre elas, a cidade que se tornava minúscula, a bobina do avião com seu barulho ensurdecedor e sem falar na tão ansiosa aterrisagem.
Cheguei em Belo Horizonte por volta de 9 e meia, como a ansiedade pra estar com meus parentes no velório do meu irmão era imensa, resolvi pagar um taxi que me levou até a cidade de Coronel Fabriciano.
O velório estava sendo realizado na Igreja Batista Filadélfia. O tempo parecia não passar, tamanha era a inquietação que invadia meu ser, mas finalmente cheguei no velório e o relógio marcava 12 horas. A igreja estava lotada, sinceramente não imaginava que teria tantas pessoas assim para dar adeus ao meu maninho. Tratei de consolar minha mãe e os meus irmãos, que assim como eu, não se conformavam com a morte tão ríspida do Maurício. Infelizmente numa hora inadequada, acabei revendo não só os meus parentes como também amigos que tinha tempo que não via.
Lembro-me como se fosse agora, eu estava perto do esquife e apareceu duas jovens que ficaram a observar o meu irmão e de repente uma disse a outra “Que desperdício” um homem tão bonito. Realmente o maninho era o mais bonito entre os irmãos, tinha aproximadamente 1,91 metros, 95 kilos, os cabelos eram encaracolados pretos, os olhos também eram pretos bem vistosos.
O Maurício era caminhoneiro, amava a estrada, era casado com a Simone e deixara dois filhos, Alípio de 8 anos e Davi de 2 meses.
Assim como o Davi, eu também perdi meu pai muito cedo, eu tinha apenas 3 meses de idade quando ele faleceu, e algo que me chamou a atenção, foi que durante muito tempo eu ficava pensando como seria a reação de uma criança de 3 meses que estava ali vendo seu pai ser velado, e naquele dia, ali no velório do meu irmão, pude constatar como seria tal reação ao estar com o Davi em meus braços, observei que ele nem tinha ciência que no meio daquela multidão toda seu pai estava despedindo desse mundo.
Durante muito tempo depois que meu irmão tinha sido enterrado, a sensação que eu tinha era que ele tinha ido fazer uma viagem e que breve breve voltaria. Era difícil ter que encarar a dura realidade que ele já não se encontrava entre nós. Já se passara 14 anos do seu falecimento, em momento algum aceito a morte dele, mas pelo menos agora o tempo tratou de abrandar a dor do coração.
Infelizmente a morte é difícil de aceitar, mas com certeza creio eu que seja a única certeza que temos nessa vida cheia de indecisões e insegurança. O ciclo se inicia com o nascimento, desenvolvimento, maturidade e finalmente somos selados com a morte. O que nos consola é acreditarmos numa vida pós-morte.
É difícil entendermos por que uma pessoa cheia de vida com apenas 33 anos de idade, com um filho que tinha acabado de nascer, teria que ser retirado do nosso convívio, mas talvez um dia eu possa ter não só essa, como todas as outras indagações da minha alma respondidas pelo Criador.