“LUZ DA VIDA”

Quando chegastes no portão de minha vida eu estava sujo...

A minha esperança, então míope, com seus óculos garrafais empoeirados, jazia no meio da bagunça, que me organizava...

E eu procurava, no meio de tudo, algum sentido para a vida,

que talvez se tivesse perdido, um dia, no percurso da caminhada,

cujo rumo se desnorteara com as passadas do tempo...

Passado num galope, que há muito, eu desistira de acompanhar

e que, naquele então, espectava, acanhadamente...

A massa ainda estava fresca...

O reboco recente, denunciava a empreitada, inacabada, de reformar a garagem modesta...

Não havia mais espaço interior para depositar o conteúdo de meu enorme baú...

das bugigangas ajuntadas por anos a fio, que sequer admitia fechar-se sem dores...

Dúvidas, então,

saltavam aos borbotões,

todas as vezes em que a comadre solidão me compelira a remexê-lo,

na inglória missão de localizar alguma recordação alentecente...

Silêncios, dos mais gritantes,

ecoavam pelos vãos mal cicatrizados das deformações naturais do velho baú, cansado de tanto peso, pesado de tantos medos...

Nem lavei as mãos para te cumprimentar,

sem abrir o portão,

sem jeito,

sem credo,

sem espaço

e na penumbra,

já que minha luz se encontrava deprimida,

pela escuridão que do peito se propalava, vigorosamente...

Minha luz, por vezes muitas, tivera na iminência de ser cortada...

Era meu outono,

com cara dos piores invernos,

daqueles em que até o sol desiste e se desbota,

se encaixota nas turvas nuvens que anoitecem os dias.

Até a lua,

intimidada,

já não se mais arriscava a ultrapassar o meu circundante muro,

por mim eregido com intuito protetivo...

Mas que menos me protegia

e mais me aprisionava com as minhas verdades, das quais me entitulara soberano dono, na primitiva visão da desesperança...

Mas o teu olhar,

Mas o teu sorriso,

iluminantes...

Para conferi-los, flexionei as pernas, do chão retirando os joelhos...

Ofuscante o brilho...

Seria a lua?

Ah! sim, a lua, ela ainda existe...

Mas não era ela, pois já a via, me sorrindo por cima do muro... que, de pé, conseguia ultrapassá-lo...

Seria o sol?

Não, nem ele seria assim tão intenso...

E não estava "nem aí p'ra mim", fugira p'ra Passargada, hibernando-se até a publicação oficial da vigência do próximo verão ...

Antes de abrir-te o portão...

discretamente,

com um tapinha nas costas,

cutuquei minh'esperança, levantando poeira...

Aferi-lhe o pulso, que ainda pulsava, em espasmódicos soluços...

Desconfiada,

desalinhada,

despertando-se com vergonha da cama desarrumada,

limpando seu óculo,

com um sorriso – cheirando a guardado - ela me confirmou:

Era o teu olhar,

Era o teu sorriso,

iluminantes...

Fizeram um clarão em meu ambiente diminuto,

iluminando a estrada de minha existência,

que se exibia estreita e encurtada...

Descortinaram um horizonte imenso,

uma avenida

ensolarada,

calçada

de esperanças coloridas,

nas colores

das flores renascidas...

Vidas,

de mais de uma – constatei – precisaria,

p'ra cumprir as nossas caminhadas,

segui-las, juntos, de mãos dadas...

Sem pesos,

sem malas

e mais nada...

Eu te amo...

Lobo da Madrugada
Enviado por Lobo da Madrugada em 20/07/2007
Reeditado em 20/07/2007
Código do texto: T572351
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