O Azedo do Açúcar

Ando azedo.

Açúcar, quero açúcar, não me deem nada além de açúcar!

Abraços, afagos, pesares, e tampouco aquele riso de quem tira os dentes pra lavar.

Somente açúcar.

Sei que ninguém quer saber de saber de mim, digo, dos meus acasos,

Digo,

Dos meus serões.

Ocorre que todo mundo quase – e sempre – apenas quer falar de si.

Não apenas saber de si, querer-se a si, não,

querem é falar de si,

Como se a si não se bastasse,

Ou se fosse necessário expandir-se mundo alheio,

Como se cada um que ouvisse carregasse um pedaço de si para os cantos

Espalhando o que há de melhor nesse mundo:

– o si de quem contou a história de si.

Açúcar,

Preciso honestamente de açúcar!

Fundamento perceber: a vivência ganhou forma, desejo e ideia.

E nem necessária vivida, veja só,

quase nem mais há debate ou assunto, ser que seja:

política, arte ou manifestação das flores,

sem que se traga a história de vida feito garantia de interlocução.

Imperativo é um verbo adornado.

Ganhou estafe píncaro, autoridade de quem diz.

Experiências pessoais não são ideologias,

Nem estruturas de poder, nem satisfação ao ego coletivo.

Experiências pessoais não são teorias.

Teorias são complexas, exigem talho de eras, congelam devaneios, afastam visitas.

Mas explicam.

Cientificam.

Consciência é quando a ciência resolve dar um passo.

Experiências pessoais não servem como teoria

Nem como prática teórica

Nem como nada que justifique algo, pois algo é sempre maior,

Algo nunca pertence apenas a alguém, já que passou pelas mãos de alguém também,

Ainda que alguém se aposse dessa coisa,

Ainda que a tenha elaborado e enclausurado,

Ainda que essa coisa – algo – seja como for, posse desde a matéria prima,

Toda ideia é uma combinação de ideias: daquilo que foi, é e será.

E a teoria – um método associado ao que acontece.

Ao dia a dia.

Da areia, da Terra, do cosmos...

Da gente!

Primeiro ocorre, depois se sabe.

Em oposição, toda ideia nula de compartilhar deixa de ser algo, deixa de ser coisa, deixa de ser algo.

E mal sabe quem só tem como fonte a vida de si e suas concepções das coisas do mundo:

– valer-se da experiência pessoal para explicar o todo é, no fundo, teoria.

Hipótese.

Mas, de modo raso.

Quer coerência plena? – forje uma biografia.

Por enquanto, eu só preciso

De açúcar!