Tango
A carne, o desejo, os corpos entrelaçados. A sedução feita movimento; um ir e vir entre dois mundos, exasperadamente belo. A magia física transpassada ao universo lúdico. Arsenal de expressões corporais fantástico, inigualável. Num compasso de dois por quatro; peito com peito, face encostada. A rosa vermelha, sob o espaço circundante. Embalo envolvente, linguagem da alma. Um toque africano, outro europeu e, pra completar, um brasileiro.
De uma paixão sofrida intensamente, a memória do que ardeu; a lembrança de um passado morto, embora vivo em meu peito. Alma resignada, corpo ao relento. O que me fez sentir aquilo, nunca antes ocorreu. Uma chama ardente dentro em mim, sonho e desejo. A canção tudo arrefeceu.
Um tango, um salão e meu coração. O trinômio assassino do meu bom senso, aclamante do meu espírito romântico e das lágrimas bentas. Luz amena, fogo intenso e calor sufocante. Vaidade que me ergue a uma postura ereta, convencionalmente adequada. Entretanto, o espírito côncavo.
Pétalas de uma flor, caídas ao chão. Era a rosa, vermelha. Seqüência mundana de fatos, dessabor dos meus planos. Passos desviados, erro grave. Canção ininterrupta; embalo mantido, dissimulado. Desconforto e cansaço, expansão do meu ser. Coordenação escassa, desequilíbrio e, enfim, perda.
Uma corrente desencadeada de passos tortos, improvisados. Apresentação suspensa, ao meio. Inexecução devastadora de todos os outros vínculos. Perdeu-se o encanto.
Estréia acerba, cruel.
Contudo, os meus ensaios são incansáveis.