DEPRESSÃO

De onde vem essa tristeza sem motivo, essa vontade inesperada de chorar? De onde vem essa falta de coragem, de ânimo, de sonhos? De onde vem essa ânsia de me esconder dentro de casa e fugir de casa ao mesmo tempo? E os pensamentos confusos, melancólicos, a me bombardear, lutando contra os bons pensamentos que insisto em vasculhar dentro de minha mente, essa guerra calma dentro de mim, de onde eles vêm?

Por que será que me calo, me fecho e desvio ao invés de ir ao encontro das pessoas?

Por que será que não reconheço a minha própria foto na estante, sorrindo abraçada aos amigos de escola? Quem é aquela pessoa com os olhos iluminados de uma felicidade inocente? Cadê aquele sorriso que eu tive um dia? Pra onde foi e onde eu fui parar, que não me encontro mais?

Nas paredes de meu quarto, meus ídolos ainda me mostram que já tive paixões, mas seus rostos não significam nada pra mim, são estranhos a me velar enquanto durmo e enquanto sucumbo em minha solidão. São estranhos tanto quanto eu mesma sou estranha.

As músicas que eu gostava, se perderam no passado e apenas ecoam sem sentido algum. Os filmes que eu costumava assistir, continuam coletando a poeira em alguma prateleira, mudos e sem valor. Minhas roupas cumprem a função de cobrir minha nudez, mas não me trazem mais beleza, nem sequer me importo com o que a moda dita. Meu cabelo, moldura para meu rosto pálido e magro, permanecem limpos e não passam disso. Não tenho forças para a maquiagem, para os perfumes, para o enfeite. Por que não cuido mais de mim?

Procuro respostas nas rezas e orações e elas me confortam. É um conforto saber que se tem alguém superior a tomar conta de nós, mas ainda chego a duvidar da existência desse alguém ou o que quer que esteja lá em cima. Me pego até pensando que fui esquecida. Duvido da fé!

Pergunto a mim mesma se estou ficando louca, mas eu mesma respondo que não é possível, ou eu não teria consciência da loucura... ou teria? Seria possível enlouquecer sabendo que se está enlouquecendo? Seria possível sermos expectadores impotentes do ataque de nossa própria insanidade?

Não falo com ninguém... não quero. Não saio... não quero. Recuso os convites... não quero... Nada quero, não quero ter que ensaiar, ter que fingir e não quero ter que me revelar frágil a ninguém. Escrevo, leio e durmo... durmo e percebo que nem quero acordar. A morte seria a solução? Definitiva fuga dos problemas, definitiva cura de todos os males e definitiva morada dos covardes? Nem pra isso, sinto coragem! Abro a geladeira e me acabo num pote de sorvete. O sabor amargo e doce do chocolate me dá um prazer quase sexual. É meu único prazer e me entrego a ele, com voracidade! Não ligo para os quilos que virão dar a minha silhueta um volume extra. Magra ou gorda, quem liga pra isso? Não há nada em mim que seja atrativo de qualquer maneira. Olho no espelho e vejo o chocolate lambusado ao redor da minha boca... patético! Isso mesmo, é o que sou, patética!

Os dias se arrastam e vou vendo, de longe e calada, os destinos se cumprirem, as pessoas felizes, e só não vejo o meu destino... Não tenho um. Não é possível que viver nessa insignificância pode-se chamar de destino... Não, o destino me foi negado...

Os cães de rua latem pela noite afora e são, certamente, mais felizes que eu, pois usufruem de uma liberdade que não tenho. São felizes porque seguem o instinto dentro deles, a luta pela sobrevivência e o apetite sexual. Quisera eu fôsse assim, feita de puro instinto, mas não sou, tenho o intelecto a me diferenciar dos animais e por isso, penso... e por isso, sofro.

Vou sentar aqui nesta varanda, observar o nascer do sol e esperar eternamente por outros ventos, por outros mares, por outros momentos que me tragam de volta ao chão. Esperar é meu lema! Aguardar é meu lema e, enquanto isso, chorar... As lágrimas lavam e me dão uma sensação de pureza. Chorar é bom, me faz bem, abre as comportas do que vai dentro de mim, materializam as emoções todas tão misturadas e confusas. Esperar e chorar...

Quando o dia vai alto, vejo uma criança na rua, brincando inocente com uma boneca velha e pelada. É uma criança negra, uma menina, que brinca com a boneca pelada, desenhando gestos angelicais no ar, cantarolando, embalando a boneca. Por detrás de minhas lágrimas, sorrio. Um sorriso tímido, quase um não-sorrir. Acho graça na menina! Me prendo a essa visão como se fôsse meu último recurso. Sigo com os olhos ainda marejados, os gestos da menina. Um sentimento diferente e tão igual aos sentimentos de antes vêm brotar em meu peito e sinto uma sombra de felicidade... inexplicável felicidade! Sigo em frente e vou tentar ver a menina amanhã novamente!

(Ninguém sabe o que é depressão até tê-la. Esse fantasma que existe dentro da gente, que teima em nos trazer para cada vez mais fundo de nós mesmos. Esse fantasma dentro da gente, que insiste em nos dizer o que fazer e como nos sentir. Esse fantasma dentro da gente, cujo rosto desconhecemos, mas que conhecemos a voz suave a nos iludir e nos levar para um abismo perdido. Nada adianta... mas há esperança! A fé, a religião, a caridade, a medicina, a psicologia nos ajudam a exorcisar esse indesejado fantasma, reconhecendo o que os motivam a agir. Nos ajudam a entender em qual momento exato abrimos os portões que os soltaram livres. É importante não se deixar lutar contra ele sozinho, pois é inútil. É importante dizer a ele que não somos ele. Mas há esperança... então, esperamos.)