FOI UM RIO QUE PASSOU EM MINHA VIDA
Saudade das crônicas do Rubem Braga. Parágrafos inteiros como fotos de um Rio de Janeiro charmoso. Um outro Rio. Havia mais passarinhos e menos prédios. Havia mais canção e menos balas. Havia um outro Rio passando na minha vida e na vida de muitos ou de todos nós...
Saudade das crônicas do Drummond. Parágrafos inteiros como músicas de um Rio de Janeiro poético. Um outro Rio. Havia mais flores e menos asfalto. Havia mais poesia e menos conversa fiada. Havia um outro Rio passando na minha vida e na vida de muitos ou de todos nós...
Saudade das crônicas do Paulo Mendes Campos. Parágrafos inteiros como memória de um Rio de Janeiro em preto e branco. Um outro Rio. Havia mais cor e menos tensão. Havia mais malandragem e menos agressividade. Havia um outro rio passando na minha vida e na vida de muitos ou de todos nós...
E, de crônica em crônica, um Rio de Janeiro de bons e velhos cariocas se fez. Janelas abertas em Santa Teresa. Bondes e sandálias que passam. Corcovado e mar. Cristo Redentor e céu. Botafogo, Urca, Leme, Leblon.
E, de poeta em poeta, um Rio de Janeiro de bons e velhos cariocas se fez. Garota de Ipanema, samba bom, calçadão. Baía de Guanabara e mar. Arpoador e céu. Flamengo, Catete, Lapa, Copacabana.
O trem que chega da Central traz gente de tudo quanto lugar: Realengo, Madureira, Cascadura, São Cristóvão, Tijuca e outros Rios. Assim cheios e tais. Não iguais. Uns quentes, outros um pouco mais.
O trem que chega da Central traz histórias e lembranças de adultos e de crianças. E são cantigas e brincadeiras. E são ternas e verdadeiras. É um Rio envolvente. Não, mais que isso: são Rios diferentes.
Saudade das crônicas e dos cronistas de antigamente.
Agora fica esperto mermão! Vacilou! Agora aguenta o fogo cruzado, barricada, arrastão, helicóptero em chamas, socos e escuridão.
Agora fica na tua! Blitz, pontapé, armamento pesado, saúde precária, coração na mão, barricadas, assaltos e cocaína de montão.
Agora ninguém segura! Corpo no asfalto, corpo sem dinheiro, sem identificação. Olho por olho, dente por dente, sem perdão.
O trem que chega da Central traz angústia e aflição. Crianças com cara de adulto, com o olhar pesado e sem paixão. Adultos de cabeça baixa, na pressa, na correria, na dispersão.
Saudade das crônicas do Rubem Braga, do Paulo Mendes Campos, do Drummond...