TENHO ORGULHO DE MINHA MÃE

Todos sentem saudades dos entes queridos que se foram. Não sou diferente, ainda que não costume destilar emoções e tenha um comportamento mais contido. Portanto, não quero deter-me, agora, em sentimentos mais ternos, até pelo fato de sofrer de um certo bloqueio relativo a demonstrações, inclusive por palavras. Mas acho muito propício expressar um tipo de sentimento que, algumas vezes, fica apenas implícito nas manifestações e que, para mim, foi de capital importância em minha vida e, com certeza, na boa formação de muita gente. Eu sempre tive muito orgulho de minha mãe. Se tenho queixa por isto ou por aquilo, como todo mundo, e uma vez que ninguém é perfeito, não poderia furtar-me ao registro de minha imensa admiração pela falecida “velha” em todos os sentidos. Suas eventuais falhas foram muito menores que a virtude que sempre luziu numa quadra histórica de atraso, dificuldades e preconceitos, especialmente quando procriou seus seis filhos - um morreu no mesmo dia em que nasceu, por barbeiragem da enfermeira. Morou eventualmente em grotas, quase na pré-história dos anos 40 e 50, dando todo respaldo ao pai. Do seu jeito, sempre com bom astral, soube manter unida uma família, com noras, genros, netos, bisnetos e parentes em geral. Administrou com carinho e sabedoria meu pai, foi companheira fiel e constante, foi amiga, foi conselheira sábia e grande estrategista de relações. Tenho orgulho da maneira com que soube se fazer admirada, respeitada e querida por todos, de sua simplicidade cativante, de seu humor e argutas observações. Não se formou em curso superior, era proveniente de troncos familiares relativamente humildes - ao menos, não aquinhoadas economicamente. Seu pai era imigrante português e, sua mãe, filha de um casal de imigrantes italianos. Lia como poucos, interessava-se por todos os assuntos e era dotada de grande intuição e sensibilidade, condição que geralmente a colocava em posição de destaque e influência. Transitava entre menos afortunados e pessoas abonadas com absoluta naturalidade, sem qualquer preocupação com eventuais diferenças. Era desapegada a bens materiais que não fossem aqueles indispensáveis a uma vida digna e compatível. Nunca testemunhei que tivesse manifestado algum preconceito, de qualquer natureza. Espírita, não era fanática ou engajada. Se meu pai teve um determinado sucesso no plano médico e político, digamos assim, minha mãe conquistou absoluto sucesso na esfera social e familiar, isto que não sabia cozinhar, não dirigia automóvel, nunca trabalhou fora, gostava de dormir até tarde e não era tipo prestativo ou atuante. E sempre foi "a supersincera", dizia tudo na lata. Viveu até os 87 anos, apesar de uma válvula cardíaca que não funcionava e que, do ponto de vista médico, impressionava pelo tamanho do coração dentro da caixa torácica. Não fora isso, teria vivido bem mais, tomando regularmente seu vinho tinto e, até oitenta anos, fumando um ou dois cigarrinhos ao dia. A seu estilo, foi incomparável e insubstituível. Nesta semana das mães, é imperativo relembrá-la exatamente como foi. Com muito orgulho, sempre.