O inferno de cada um

Raul era um cara legal, embora muitas pessoas o achassem estranho e ele não gostasse de nenhuma destas pessoas. Sua mulher dizia que ele iria para o inferno se não mudasse, não parasse de ouvir música do capeta (Raul adorava um bom e velho rock) e não aceitasse Jesus, como ela havia feito depois que os dois tinham casado. Raul detestava 'crentes' e era difícil manter um casamento daqueles, com sua esposa criticando tudo o que ele fazia e gostava, fazendo questão de lembrá-lo a cada piscada de olho de que estava condenado ao inferno. Mesmo com toda falácia de sua mulher, Raul continuou fazendo o que gostava até seu último dia de vida, quando seu dia finalmente chegou: Raul levou um escorregão idiota num dia de sol e deu com a cabeça no meio fio. Morreu na hora.

A alma de Raul deu uma última olhada para seu corpo, despediu-se e sentiu ser arrebatada para outra dimensão.

Como se abrisse os olhos para uma luz em seu rosto, depois de ter cochilado na escuridão, Raul se viu num lugar esplendido, caminhou por um logo corredor por entre nuvens e podia ouvir uma música celestial, do tipo que sua esposa ouvia, vindo das estrelas que por sinal estavam bem próximas. Logo viu, em forma de anjos, alguns de seus conhecidos (não sabia que eles tinham morrido também) mas a maioria era as pessoas que ele mais detestava na vida, os amigos de sua esposa. Aqueles que tentavam exorcizá-lo, convertê-lo e "salvá-lo" do lamaçal do pecado.

Raul atravessou um portão de ouro, onde encontrou com três anjos, dois do sexo feminino tocavam harpas e entre esses dois, um do sexo masculino esperava por Raul. Ele se aproximou do anjo do meio e disse:

- Quem diria, depois de tudo que aprontei, vim parar no céu.

O anjo sorriu discretamente e disse:

- Não se engane, meu amigo, aqui é o SEU INFERNO.

Fazia sentido.