ADEUS ANO NOVO
Tenho bronca da paz ao meio dia. Ou à meia noite.
Nenhuma festa cheia de gente sorrindo por nada me alegra os pergaminhos. Tampouco ordenará que novos dias virão; novo-tempo, misericórdia! Tenho bronca da paz estampada na cara de quem quer paz coisa nenhuma, paz para si – obviedades à parte, e não falamos mais nisso – mas pergunte de que igualdade se fala: e aí veremos com quantos mortos se constrói a paz.
Minha melodia quer ser apenas melodia,
não usarei branco
ou tons pacíficos
harmoniosos!
Nada disso,
camisa da banda
Slayer, Metallica ou Megadeth
Bermuda desfiada pelo conforto da idade
Tão à vontade que irei de chinelo
RG fica guardado no porta-luvas;
A chuva que me espere um pouco,
Posso até trocar de camisa.
Pode ser a do Motörhead.
Elis Regina ou do Gardel.
Importa é estar de acordo com a liberdade; falando em linguagem confusa – se for o caso. Fundindo um pouco a cachola se for outro caso. Observando as figuras serenamente histéricas no meio da rua, de buzinas pro alto, de papo pro asfalto, olham-se para nada e bebem demais.
O ano novo é uma passagem etílica.
Dobramos o ano
bêbados.
O que se apresenta de um novo tempo,
Às vezes de um novo século,
Mais às vezes ainda de um novo milênio,
É a ressaca.
Feliz de quem inventou o Engov.
Melhor ainda por quem inventou a comida do réveillon!
Tem lugar que vai lentilha, tem lugar que é lagosta.
Em todas as casas alguma rolha explode.
Não pode faltar arroz-de-alguma-coisa: ervilha, camarão ou bacalhau.
Às vezes se repete a maionese do natal. Às vezes não.
Tender, pernil, lombo, leitão, mas a farofa pode repetir.
Pode não: deve.
O problema é que toca um tambor bravo na gente, dá suadouro, uma tristeza.
Comemos e depois jiboiamos.
De tanto que comemos.
Começamos de ressaca e empanturrados
Por isso – e tão somente por isso – duvido que o desejo de paz seja sincero.
Metade da fome do mundo não comemora coisa nenhuma. A outra metade fatura o sonho de que um dia a fome será sempre um passado à beira da gente.
A outra parte do mundo acordará de ressaca.
E no evidente mau-humor.
E a rosa das flores não será tão flor assim – a lógica dos homens é a vontade de que o perfume na pele dure até amanhã, de que a bateria do celular pudesse aniversariar minimamente carregada,
Na lógica, os homens têm algo de eterno.
Por isso todo mundo sabe que ninguém será sempre futuro, na mesma medida em que se perde nas entrelinhas do tempo,
no cálculo das retas
nas labirintas raízes do mundo.
Verdade é
não há melhor lugar do que reconhecermo-nos
em alma e gente o tempo todo – pois então o brasil é a mesopotâmia do caos.
Pronto! Parte feita!
Já fiz a minha – e a sua? Vamos lá! – diga que aqui nada funciona! – vamos lá! – fale de você, fale da gente!
Tente ter ideias vis iguais às minhas, à meia noite quando na verdade já passam das três.
Detesto gente que se diz feliz o tempo inteiro.
Mas desfaço ainda mais de quem rabuja sem parar.
Pensei em começar o ano pelo equilíbrio.
Felicidades a você que vive o ano começar!