Este não é o meu país II
No dia 29 de janeiro de 2012, escrevi esta crônica, hoje reeditada e parcialmente reescrita para atualizar os acontecimentos políticos de então. A vida, como sabemos, é uma eterna mutação. No âmbito político, porém, os desmandos continuam os mesmos. A corrupção, todavia, mudou muito. Para pior. Atualmente, os malfeitores encastelados no poder não se contentam com os famosos “dez por cento” de comissão. Exigem mais. Como divulgou a imprensa, bilhões de reais foram surrupiados dos cofres da Petrobras.
O personagem desta história foi criado pela imaginação deste cronista, insatisfeito com “tudo isso que está aí”, para demonstrar o passado de desenvolvimento do Brasil e a seriedade com a coisa pública, deteriorados ao longo dos últimos doze anos.
Em janeiro de 1958, Genaro Brasileiro do Brasil, nascido na Paraíba, completou dezessete anos. Inteligente acima da média, leitor compulsivo, logo cedo teve seu interesse despertado para assuntos políticos. Instruiu-se sobre a história antiga, inteirando-se do apogeu e fracasso das formas de governo e seu domínio soberano ou influente sobre povos e nações, como os impérios que se destacaram no cenário mundial: Romano, Bizantino e Austro-Húgaro, na Europa; Babilônico, Persa, Otomano e Mongol, na Ásia; Asteca e Inca, nas Américas do Norte e do Sul.
Genaro acrescentou aos seus conhecimentos, histórias de outros países que, em tempos recentes, adotaram essa forma de dominação: Grã-Bretanha, China, Rússia, Espanha e Portugal, que impuseram aos povos dominados seus sistemas político, econômico e cultural. A Alemanha também se inclui no grupo dos partidários do imperialismo. Com truculência e desejo insano de dominar o mundo, Adolf Hitler exterminou mais de seis milhões de judeus, durante a Segunda Guerra Mundial. Os Estados Unidos da América também são considerados imperialistas, principalmente pelos partidos políticos de esquerda, em face de sua forte influência sobre outras nações e em razão do seu poderio militar e econômico.
Antes de 1964, depois de alcançar a maior idade, Genaro foi estudar na Suíça, onde permaneceu até 1980. Quando deixou o Brasil, desconhecia os benefícios da vida moderna. O país era pobre e atrasado, enquanto a atmosfera política, excessivamente aquecida por ideais comunistas de alguns de seus conterrâneos, estava prestes a explodir.
O paraibano retornou ao Brasil com outra visão do mundo. Estava ansioso para ver se o progresso havia chegado à terrinha. Ele a deixara sob o manto de um atraso crônico. O país reclamava a falta de muita coisa. Sua infraestrutura era precária, não havia estradas asfaltadas, a energia elétrica era escassa, os telefones poucos ou inexistentes, a vida difícil e conturbada. Era um país de bananas, assim considerado pelas potências internacionais.
Ao retornar, viu outro cenário. Os comunistas locais foram vencidos pela força militar governante e expulsos da vida política nacional. Esses maus brasileiros desejavam entregar o país à administração de impérios ditatoriais, como Rússia e China, e, ainda, estreitavam suas amizades com Cuba e Albânia, ditaduras de severa repressão aos dissidentes do regime atrasado e virulento que defendiam. Teria sido o fim do Brasil ordeiro, multirracial e solidário, caso os militares não interviessem, como o fizeram. Restrição deve ser feita apenas à violação dos direitos humanos, mas, diga-se, guerra é guerra. O lado contrário também agiu com idêntica truculência, pois adotou o terrorismo como arma de combate. Esses assassinos foram responsáveis pela morte de dezenas de defensores da liberdade.
Genaro logo constatou que o país crescia em ritmo acelerado, revelando acentuado aumento do PIB. Era o Milagre Econômico dando novas feições ao Brasil.
O governo Costa e Silva (1967-1969) criou a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e o Movimento Nacional de Alfabetização (MOBRAL): a primeira, para assistir aos índios abandonados; o segundo destinado à alfabetização de jovens e adultos.
O general Garrastazu Médici (1969-1974) promoveu a diversificação das atividades produtivas, enquanto o presidente Ernesto Giesel (1974-1979) construiu as usinas de Tucuruí e Itaipu, esta, a maior do mundo.
Outras benfeitorias foram implantadas para impulsionar o desenvolvimento nacional. O Proálcool, milhares de quilômetros de estradas asfaltadas, a ponte Rio-Niterói e diversos empreendimentos, diretos ou por consequência, melhoraram a vida do brasileiro.
O atento observador reconheceu o alto custo desse desenvolvimento. A dívida externa cresceu assustadoramente. Mas, é bom entendermos: Sem isso, o Brasil talvez ainda fosse considerado um país de bananas. Não teríamos visto, tão rapidamente, o advento da televisão em cores, o aumento da produção de petróleo e tantas outras facetas de uma economia em expansão.
A partir daí, Genaro sentiu drásticas mudanças na economia do país, proporcionadas por ambicioso programa instituído pelo ex-presidente Itamar Franco, que assumiu a presidência após o impeachment de Fernando Color de Mello (1992-1994) e continuado com eficiência pelo também ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), o pai do Plano Real, genitor responsável que soube agir com determinação, espírito público e grande capacidade administrativa. Ações ousadas de privatização de empresas públicas perdulárias e ineficientes constituíram o corolário do desenvolvimento, hoje usufruído pelos atuais governantes e seus aliados oportunistas e desonestos.
A corrupção, a partir de 2003, grassa vergonhosa e celeremente em todo o território brasileiro. Do gari, que vende o saco vazio, destinado à coleta do lixo, a parlamentares, ministros, juízes e apaniguados de coloração vermelha, passando por sindicalistas e funcionários públicos inescrupulosos. Essa situação tem revoltado Genaro, defensor intransigente da moralidade pública.
Insatisfeito com tudo isso que está aí, Genaro lembrou-se de excelente poema, intitulado O Meu País. Respeitador do direito, entre muitos, o intelectual, pede vênia ao insigne poeta Zé Ramalho, paraibano como ele, para fazer seus esses acalorados versos:
Um país onde as leis são descartáveis,
Por ausência de códigos corretos,
Com quarenta milhões de analfabetos
E multidão maior de miseráveis,
Um país onde os homens confiáveis
Não têm voz, não têm vez, nem diretriz,
Mas corruptos têm voz e vez e bis
E respaldo de um estilo incomum,
Pode ser o país de qualquer um,
Mas não é, com certeza, o meu país.
O conterrâneo de Zé Ramalho solicita nova permissão ao autor para, suprimindo os quatros primeiros versos da quinta quadra do interessante poema, também fazer seus os versos que retratam, em cores fortes e indeléveis, o Brasil de hoje, assaltado por bandidos de colarinho branco:
...
Um país que engoliu a compostura,
Atendendo a políticos sutis,
Que divide o Brasil em mil brasis
Pra melhor assaltar de ponta a ponta,
Pode ser o país do faz-de-conta,
Mas não é, com certeza, o meu país!
Genaro tem razão. Ele, como eu, e, por certo, você, gostaríamos de ver o Brasil livre das mazelas que o tornam distanciado das primeiras posições no ranking das nações com melhor desenvolvimento humano. Entre os países corruptos, todavia, deverá alcançar a liderança dessa desonrosa qualificação em futuro próximo. O PT continua no governo. O PMDB, PDT, PP e os demais partidos que o apoiam, facilitarão sua chegada ao topo da corrupção internacional, vergonhosamente conhecida e execrada.
A reedição desta crônica também servirá de contestação para o que disse Luiz Inácio Lula da Silva, ao reivindicar para si e, agora, para sua sucessora, mais quatro anos de governo. Disse ele, arrogantemente, que necessitariam de mais tempo para construir o que outros governos não fizeram em mais de quinhentos anos. Quanta petulância!
Será que essa excrescência política não tem olhos para ver que algum êxito de seu malogrado governo decorreu da estabilidade econômica e de providências saneadoras, como a privatização de empresas perdulárias, objeto da ganância desonesta de seus aliados? Será que ele não tem ouvidos para ouvir o que dizem os especialistas, quanto à derrocada da economia; aumento da inflação, destruindo o poder de compra do trabalhador; da corrupção desenfreada que mina a riqueza nacional; e o clamor das ruas por mudança?
Talvez não. Ele já se disse cego e surdo para ver e ouvir a roubalheira que permeou o seu desgoverno. Nada soube a respeito do mensalão petista, do... Bem, paro por aqui, pois enumerar os muitos acontecimentos dos últimos doze anos implicaria elaborar extensa lista de irregularidades. E eu já me sinto cansado de escrever este longo texto. Também não seria conveniente esgotar a paciência do benevolente leitor.