A Casa de Cada Um

Acho que de fato acredito na esperança que morre depois de tudo, de ti, de mim. Muito menos me alucina o desprazer de certas vidas quando se deparam com amor e lágrimas. Não conheço ojeriza, não tenho o desejo de possuí-la noites seguidas, em desvario. Acontece atualmente aquele desgaste curioso que as almas silenciam. Uma falta de talento para valores que, de fato, merecem atenção. Não produzirei perguntas. Não há por que formular nada de “novidade” a uma geração tão “nova” assim.

A esperança no amor, apesar de seus percalços, tropeços, segue tatibitate na trilha costumeira. Sei que há invenções ultra radicais que envelhecem mais os homens do que torná-los jovens. Na minha infância tive o privilégio de ver casas abertas, amiguinhos de colegial depois das 19 horas, tudo sem valor superior, nem ouro, prata. O calor de pele, o hálito infantil, as testas suadas de tanto correr pelo quintal em brincadeiras, vigor e deduções. Curiosamente, não sei de que modo, essas casas fecharam-se. Acolhi os bons autores, cataloguei alguns, engavetei mais do que produzi, os coleguinhas aproveitaram o melhor da vida e permaneci no oculto. No entanto não ouso reclamar ou desdizer algum dito. Tudo corre na normalidade de sempre.

Cada indivíduo permanece sendo sua própria habitação. Ocorre que a questão de aceitação decorre de uma crítica íntima ( talvez daí venha a insegurança de todos os homens). O cartão de visita, o desenrolar inteligente de uma novidade em afeto decorre da porta aberta. Na rua da minha infância, numa reta íngreme totalmente, feita de pedras antigas, via dúzias de meninos livres, sem asas, verdadeiros Ícaros urbanos. Eu permanecia no limite da grade e do muro, a espionar. Naqueles meninos havia o verbo da certeza de que tudo que nasce preso, liberta-se. Na ocasião, minha mente virgem (pura de leitura, maturidade) sentia sem ousar dizer algo sobre. Mas havia, sim, asas nessas crianças.

A minha melhor casa tem sido uma modesta kit net no fim da rua. Em seu bojo atolei papéis, saudades, livros , doses extensas de cafeínas e uma intensa dor de curiosidade que vai do trabalho das formigas à elaboração dos últimos motores Fiat. Também alguns bons retratos de uma temporada passada que alcunhei de jovem – mas porque eu assim defini. Para alguns, a passagem tende a ser dolorosa na visão da perda material. Acho que , no afastamento de seres indecorosos e falsos, desamores, foi a melhor coisa. Acordo, mexo os membros , tudo normal. As asas de dentro estão impecáveis, intactas para um novo voo. Abro a janela. Ainda, anos mais tarde, existem na rua uns “Ícaros urbanos”. Me sorriem gentis e gratos.

A casa de mim é a asa do tempo. O voo é livre. Cada um abre a porta da casa que tem....

J Luiz
Enviado por J Luiz em 02/07/2014
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