Rosto de uma Crônica Vaga
Entre os dedos escorre a última ternura. Há meses não desejo me posicionar além do necessário e tive que me retirar do cartaz. A vista mais uma vez foge das lágrimas. Braços se estendem para a antiga mania de querer atingir e ser atingido. Lá fora, quantos caminhões e cargueiros movimentam-se ocupados, é dia útil. Inútil dia para quem deseja apenas sentir, iludir-se, pintar-se na maquiagem da vida.
Quem sabe o parágrafo seguinte queira nos relatar algo, a mim e a você, ilustre conviva de sempre. Embora eu reclame de minha solidão mas ela é uma glória íntima , uma necessidade não permanente. Tudo que está só não corre atrás de perguntas e decifrações e tampouco almeja escrever além da sombra. É uma novela curiosa. Lá numa região distante do interior do RJ, havia uma lagoinha modesta que amanhecia coberta de vertigem e de sonho. Soberba lagoinha, era a parte mais íntima de uma paz imortal. Lembro-me de que certa feita ela desapareceu e prontamente uns bovinos puseram-se a pastar onde antes era seu intocável trono. De que serve a soberba?
Daí vêm as estrelas. Da imensa janela da casa-grande, direcionada ao pasto central, havia uma lacuna colorida provocada pelas estrelinhas mais altas. Um prato de anestesia e curiosidade para um coração plenamente infantil. Carroll deduz isso em seus personagens milagrosos e atemporais. Não o conto das estrelinhas e nem a dita cor de tudo isso – não há em algum volume publicado. A janela abria-se para o mundo de verde e esperanças. O barato da questão era reparar cotidianamente na mesma figura e não enfadar-se. Manter o estilo e o ritmo, numa paz cadenciada de música. Justamente nessa ocasião eu desacreditava na sinceridade mascarada de certos adultos, ocupados demais para repararem em um coração elástico e febril, que desejava abarcar e construir tudo de um só gole.
Não imaginava que anos posteriores todo esse apanhado me legaria personagens, saudades e filosofias curiosas. Feito uma pesada porta alva do colégio católico, no centro de Vassouras, onde vivi enfurnado semanalmente entre freiras, terços e rezas muito doces. Depois ganhei o prato feito do pecado de pensar e ganhei o mundo. Vejo hoje que viver é uma aposta cruel que não admite erro. É pura lentidão perigosa. Por mais que eu assevere a decadência da pressa, cerro os olhos e vejo que alguma coisa não sólida me ultrapassara, num golpe de ar. Não acredito na morte de tudo, já que não há mais pressa. A questão é que não quero mais retirar da memória o que me sufoca ou lacera. Vamos no caminho do sorriso..é o que há de mais doce.
Plantarei crônicas íntimas e as tornarei sabiamente impressas. Espalhá-las-ei pelas esquinas.....